Exame - Edição 1180 (2019-03-06)

(Antfer) #1
6 de março de 2019 | 61

Conferência do Clima
em 2018: reforço ao
Acordo de Paris

significa trazer para o monitoramento do
uso da terra o nível de detalhe equivalen-
te ao da foto da placa de um carro numa
multa por infração de trânsito, um caso
inédito no mundo, mesmo em países de-
senvolvidos.” Cerca de 20 000 servidores
na nuvem garantem que tudo seja com-
putado e armazenado.
O bom funcionamento do novo sistema
vai depender também da validação do
Cadastro Ambiental Rural, que pretende
contabilizar o tamanho dos ativos e pas-


sivos ambientais do agronegócio brasilei-
ro. Os dados coletados em todo o país nos
últimos quatro anos (o prazo de cadastro
foi adiado quatro vezes pelo governo) per-
mitirão verificar o cumprimento do Códi-
go Florestal — legislação que estabelece
os limites de uso da terra em cada um dos
biomas e que indica onde a vegetação na-
tiva deve ser preservada. Pela lei, atuali-
zada em 2012, agricultores e pecuaristas
são obrigados a manter trechos de mata
ciliar, à beira de rios e córregos, e cotas de
vegetação que variam de 20% a 80%, de-
pendendo da região. Numa espécie de
declaração de imposto de renda, os fazen-
deiros reportaram o tamanho, as frontei-
ras e a composição de suas terras, indi-
cando via imagens de satélite as áreas
produtivas e as superfícies de vegetação,
conservadas ou degradadas. Cerca de 5,5
milhões de imóveis rurais já foram cadas-
trados na base do governo — 100% da área
passível de cadastro no país.
Mas falta comparar as informações de-
claradas com as que o governo detém.

Sobreposições de limites de proprieda-
des e até de áreas maiores são esperadas,
dado o caos de registros fundiários que
se vê em alguns estados do país. E é jus-
tamente dos estados a responsabilidade
de elaborar os chamados Planos de Re-
gularização Ambiental, que restituirão
áreas de vegetação nativa desmatadas ou
degradadas em cada canto do Brasil. O
processo está sob a alçada do Serviço Flo-
restal Brasileiro, que saiu da estrutura do
Ministério do Meio Ambiente para o Mi-

nistério da Agricultura no governo de
Jair Bolsonaro. O órgão não respondeu
às perguntas da reportagem até o fecha-
mento desta edição.
Garantir respostas imediatas aos aler-
tas de desmatamento e, por consequên-
cia, políticas efetivas que aliem agrone-
gócio e conservação são imperativos que
não dizem respeito apenas ao Brasil. A
despeito da pouca simpatia demonstrada
pelo atual governo a esse compromisso,
o país é signatário do Acordo de Paris,
assinado em 2015 por 195 países durante
a Conferência do Clima da ONU, a COP21.
A mais ampla coalizão para reduzir emis-
sões de gases estufa definiu que é preciso
frear o aumento da temperatura global
em até 1,5 o C em comparação com a era
pré-industrial — e assim evitar que o fe-
nômeno da mudança climática cause
impactos ainda mais duros sobre o plane-
ta. No âmbito desse acordo, o Brasil pro-
meteu restaurar 12 milhões de hectares
de floresta. Desde então, não se sabe como
e quando essa promessa será cumprida.
A única certeza é que ela passa pelo mo-
nitoramento eficiente do uso da terra. “O
monitoramento vai ser um elemento-
-chave nos próximos anos, já que muitos
países e consumidores estão cada vez
mais interessados em rastrear tudo o que
tem impacto na mudança do clima”, diz
Claudio Almeida, coordenador da seção
de processamento de imagem do Inpe.
Enquanto isso, a expectativa de prota-
gonismo depositada no Brasil desde a
COP21 tem migrado para a China. Um
levantamento recente da Nasa, a agência
espacial americana, mostrou que o pla-
neta está mais verde do que há 20 anos,
graças, principalmente, à China. A área
global de cobertura folhosa cresceu 5%
desde o início dos anos 2000 — é um ga-
nho de superfície verde correspondente
à área da Floresta Amazônica. Sozinha, a
China responde por um quarto desse au-
mento. Por lá, quase metade do efeito
vem do plantio de árvores para reduzir a
erosão do solo, a poluição do ar e as mu-
danças climáticas. Mas não se trata só de
floresta — cerca de um terço do aumento
da área verde vem de áreas agrícolas. Ain-
da assim, o esforço dos chineses se faz
notar. Por tudo o que representa nessa
área, o Brasil não pode ficar para trás. Q

63,3%(1)


29,4% 4,8%(2)


2%


Florestas 0,5%


Áreas de
plantio e
pastagens

Campos e
pastagens naturais

Água

Outros

COMO A TERRA É UTILIZADA NO BRASIL


Os dados mais recentes de imagens de satélite mostram que pouco mais de um terço da
terra no país é dedicado à agropecuária — taxa comparável à média mundial, que é de 37%


(1) Inclui florestas densas, formações savânicas (ou florestas abertas) e florestas plantadas (menos de 2% do total)
(2) Inclui formações campestres, campos rupestres e áreas úmidas, como o Pantanal,
também utilizados para a atividade agropecuária Fonte: MapBiomas

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