quase nu, pintado de várias cores, com uma varita de guizos e fitas na mão, pulando em
torno do soba amochado num banco e da minha mãe para o meu pai, não gorda, nova,
de bata de trabalhar na cozinha, mirando-me sem me aproximar
- Este é o menino que trouxeste de Angola?
a minha mãe com cintura, sem pregas na testa, sem pregas na cara, direita, de
movimentos leves e uma aspa de sol tombada da claraboia do prédio em que passeavam
pombos, de patinhas nítidas vidro fora, no ombro, isto às seis e dez no meu relógio, seis
e onze para ser mais exato que ele não se engana, pelo preço que paguei também era
só o que faltava e além disso os ponteiros um ar tão seguro que não me atrevo a
contrariá-los, aceito o tempo que me dão e calo-me, sempre aceitei o tempo que me
deram e calei-me, seis e onze e pronto ou seja precisamente quando a porta do posto
de enfermagem e a do apartamento se abriram e Sua Excelência surgiu em simultâneo
na rua em frente do café e no limiar da sala, na rua pálida, sem maquilhagem, de
pálpebras mortiças e cabelo escorrido e na sala de roupa nova, com um penteado de
cabeleireiro, unhas pintadas de vermelho e um anel que eu não conhecia, hei de
conhecer pelo rombo na conta do banco, a fitar-me como fitava a mala ao meu lado, já
pronta, já fechada, num relance desinteressado, rápido, a perguntar - Achas que temos mesmo de ir à matança do porco?
instalando-se sem pressa no sofá com metade da coxa esquerda ao léu, umedecendo
o indicador na língua
(que bom vê-la umedecer o indicador na língua)
a fim de virar melhor as páginas.