Todos os personagens também percorrem um caminho em que a dor se faz
presente. Para alcançar seu destino Fátima precisou enfrentar as perdas e
desesperança, o filho mais novo encarou a dor física e o medo, Khaim desafiou a
pobreza e a saudade e o alfaiate superou os julgamentos.
Essa temática não coincidentemente está manifestada em todos os contos
selecionados, como também em muitas histórias que compõem meu repertório. De
dentro para fora, falamos sobre o que nos toca e o que queremos tocar o outro. Em
todas as trajetórias, tão importante quanto o fim é o percurso, que é árduo e é onde
ocorre a busca pela razão de cada existência.
Em “O brocado maravilhoso” há duas características que o difere dos
demais contos que escolhi. Uma delas é a presença do fantástico, materializado pela
velhinha e pelo cavalo de pedra que estão na entrada na caverna, pela existência das
fadas e pela transformação do sonho em realidade quando o brocado desce do céu.
Esse tipo de recurso é recorrente nos chamados “contos maravilhosos” e é definido
pela aceitação do sobrenatural diante das leis do mundo real, pela aparição de
entidades como duendes, fadas e bruxas, pela falta de estranhamento por parte do
ouvinte e dos personagens frente aos acontecimentos. Em princípio, tive receio
quanto à primeira prova pela qual o personagem deveria passar, ao ter que arrancar
seus dentes e colocá-los na boca do cavalo de pedra. É o primeiro momento de
ruptura com o mundo concreto, pois mesmo a presença inusitada da “velhinha tão
velhinha que parecia ter uns 200 anos” ainda é possível. Como a imagem é bastante
esquisita, suspeitei que pudesse causar alvoroço ou riso na plateia. Foi na forma de
narrar que tudo se resolveu. Não dei brecha para a dúvida, não resisti em descrever
esse trecho de forma natural, não reagi a ele com espanto. Assim, estabeleci a
verossimilhança necessária para que o conto seguisse e a plateia assimilasse que o
fantástico se faria presente. Na descrição em que o filho mais novo realiza a ação,
não há margem para o apego ao real, a plateia já compreendeu que dentro daquele
universo encantado a situação é aceitável.
Além da linguagem metafórica que simboliza arquétipos, esse conto
maravilhoso transpõe o sofrimento e a busca da realização de um personagem para
outro. Ao estreitar laços entre mãe e filho, a história aborda a determinação em se
fazer algo pelo próximo. O filho mais novo apoia a mãe em seu sonho, sugere a ela
uma possibilidade de vivê-lo e depois proporciona sua realização. Por isso, ele é
recompensado com a felicidade.
casulo21 produções
(Casulo21 Produções)
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