28 |Valor|Sexta-feira,3deabrilde2020
O
vigordas democracias ou comoas
democraciasmorremé um dos te-
masmaispresentesatualmenteno
debatepolítico. Vários autoresre-
lacionam umasériede motivosparaa so-
brevivênciade umagovernabilidadeparti-
cipativa. Umadas causaspara alongevida-
de de sistemasde soberaniapopular, po-
rém,está ausentedessesbest-sellerscon-
temporâneos.Jánametadedoséculopassa-
do essa premissafoi apontadapor um dos
maiores intelectuaisbrasileiros: não existe
democraciaforteem um país sem uma pro-
duçãoprofícuanocampodasociologia.
Sem conhecer erefletir sobreos temas so-
ciológicos,a origem e a estrutura de si, uma
sociedadeserá facilmentedominadapolítica
eeconomicamente por poderesimperialistas
e, no âmbito interno, amaioria da população
sempreseráoprimidaporumaminúsculaeli-
te,serviçal,porsuavez,deumaeliteglobalpa-
ra aqual, por muitas vezes,ovotopopular é
desprezado em nomede seus interesses. Esse
autorfoiFlorestanFernandes,mortoem1995
equecompletaria100anosem22dejulho.
Na comemoraçãodo centenário, a Editora
Contracorrenteiniciaum trabalhohercúleode
reediçãodas principaisobrasdo fundadorda
sociologiacríticano país. Adata inspiroua ela-
boraçãode uma peça de teatro, escritapelo ator
eautor OswaldoMendes(do ProjetoArte &
CiêncianoPalco)comacolaboraçãodojornalis-
ta FlorestanFernandesJúnior,apartirdas cor-
respondênciasentreo sociólogoe o críticoAn-
tonioCandido(1918-2017).“Serãohistóriassa-
borosasdeles,do exílio, da vida universitáriae
do país. Não terá um protagonismodo meu pai,
mas de dois dos principaisnomesda Universi-
dadedeSãoPaulo”, afirmaojornalista.
O primeirolivro da Coleção Florestan Fer-
nandesserá “A Revolução BurguesanoBrasil:
Ensaio de InterpretaçãoSociológica”, escrito
comouma espéciede resposta —etentativa
de explicação —aogolpemilitar de 1964,
que completou 56 anos nesta semana.
Na sequência,acoleçãocoordenadapelo
professor BernardoRicupero (do Departa-
mentodeCiênciaPolíticadaUSP)incluirásua
grandeobra,“A FunçãoSocialda Guerrana
SociedadeTupinambá”. Nesselivro, Florestan,
de maneirainéditaecientificamenteconsis-
tente,apartir de seu conhecimento da teoria
da organização social, reconstituiu osistema
tribaleconseguiuexplicarumacivilização.
As reediçõesserãoenriquecidascom prefá-
cios e materialcomplementarsobreaimpor-
tânciado pensamentodo autor. No primeiroli-
vro,André Botelhoe AntonioBrasilJunior,am-
bos da UniversidadeFederaldo Rio de Janeiro
(UFRJ),assinama apresentação. Umaentrevista
com GabrielCohn,ex-diretorda Faculdadede
Filosofia,Letrase CiênciasHumanasda USP, on-
deatuouFlorestan,completaaedição.
Farãoparteaindadacoleçãoosclássicos“A In-
tegraçãodo NegronumaSociedadede Classes”
e“Educaçãoe Sociedadeno Brasil”, alémdas
obrassobreoexercícioda profissãode sociólo-
go eopapel da sociologia,permitindo, assim,
uma revisitadas novasgeraçõesao trabalhode
Florestan,cujoslivrosque circulamhoje pelas
salasde aula nas universidadesforampublica-
dos na décadade 1970,dandoafalsa impressão
ajovensestudantesdeserummaterialdatado.
Acoleçãopermitiráàs novasgeraçõesde lei-
toresatestaremadifícil construçãode uma so-
ciedadedemocráticae a funçãoda sociologia
para ergueresse edifício, sobretudoem países
comoo Brasil.“Nenhumpaís da periferiado
mundocapitalistaterá hoje condiçõesde lutar
contrao subdesenvolvimentoe a dependência
se não for capazde produzirteoriaoriginalno
campodas ciênciassociais”, afirmouFlorestan
em entrevistaque originouo livro “A Condição
doSociólogo”(1978).“Emummomentodetan-
to obscurantismoe cultoà ignorância,acredita-
mosqueeraurgenteresgatarasideiasdele”, jus-
tificaoeditorRafaelValim, da Contracorrente,
que discutiaa coleçãohavia três anos com o jor-
nalistaFlorestanFernandesJunior.
Oconjuntoda obra de FlorestanFernandes
éum painelsobre aampladiversidade social,
SOCIOLOGIA
Nãohádemocracia
forte empaíssem
produçãofértilno
camposociológico,
diziaFlorestan
Fernandes,quetem
reediçõesdelivros
emcentenário.Por
JorgeFelix,para o
Valor,deSãoPaulo
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retrato do Brasil
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