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A14 SÁBADO, 11 DE ABRIL DE 2020 O ESTADO DE S. PAULO
Esportes
Especialistas ouvidos pelo ‘Estado’ acreditam que a pandemia vai servir para dar o pontapé inicial a uma grande mudança na modalidade
Andreza Galdeano
T
atiana Weston-
Webb, brasileira clas-
sificada para os Jogos
Olímpicos na modalidade, vi-
ve em Kauai, uma das ilhas
do Havaí, e tem conseguido
treinar diariamente. A surfis-
ta espera aproveitar o fato de
morar em um dos poucos lo-
cais de praia no mundo em
que as limitações da quaren-
tena não estão tão rígidas.
“Aqui no Havaí estamos libe-
rados para surfar, então esta-
mos treinando e curtindo.
Quando não estou na praia, eu
realmente fico em casa, não va-
mos ao mercado todos os dias, e
estou aproveitando muito para
cuidar do meu jardim”, conta a
atleta, que estreia nesta segun-
da-feira mais uma temporada
de seu programa no OFF, canal
brasileiro de TV por assinatura.
Apesar de seguir treinando,
Tatiana também foi prejudica-
da pela pandemia. Por causa do
isolamento, seus treinadores
não podem viajar e a surfista se-
gue sem acompanhamento. Ela
conta que o ritmo de trabalho
vai melhorar quando a quaren-
tena passar e já pensa nos Jogos
do Japão. “Estou feliz com o
adiamento da Olimpíada por-
que com essa crise estava muito
difícil de treinar. Vamos ter um
bom período para se adaptar, se-
guir treinando e acreditando
em bons resultados nos Jogos”.
A Olimpíada será disputada
entre os dias 23 de julho e 8 de
agosto de 2021. “Eu realmente
estou me sentindo bem por cau-
sa do adiamento, é muito difícil
treinar em casa, sozinha, sendo
que normalmente estaria via-
jando, competindo e treinando
forte. Agora todo mundo está
em quarentena, então não dá pa-
ra fazer esse tipo de trabalho.
Acaba sendo um período de pre-
paração bem diferente”, expli-
ca a gaúcha de Porto Alegre. No
Rio, surfistas que quebram o iso-
lamento são retirados do mar.
As gravações do programa
“Tatiana Weston-Webb” fo-
ram feitas no Taiti antes da co-
vid-19 tomar proporções gigan-
tescas. A surfista vive a expecta-
tiva de ajudar os fãs durante es-
se período de isolamento. “O
meu objetivo sempre foi ins-
pirar outras pessoas, não ape-
nas ligadas ao surfe, mas no
mundo inteiro. Quero que as
pessoas sejam mais positivas
e pretendo emitir boas ener-
gias para todos”, afirma.
A surfista foi a primeira re-
presentante do Brasil na mo-
dalidade a se garantir para
Tóquio. Ela assegurou uma
das vagas com a vitória nas
oitavas de final da etapa de
Peniche do Circuito Mundial
de surfe, em setembro de
- Do lado feminino tam-
bém estará Silvana Lima.
O programa que ela apre-
sentará terá 13 episódios exi-
bindo treinos e viagens ao re-
dor do mundo. No primeiro
capítulo, ela comenta sobre a
escolha de defender o Brasil
após competir representan-
do o Havaí.
WILTON JUNIOR / ESTADÃO
Oportunidade. Paralisação do futebol pode alterar o calendário: o Campeonato Brasileiro, por exemplo, teria mudanças
BRASILEIRA TREINA
LIVREMENTE NO HAVAÍ
Ciro Campos
Ricardo Magatti
Algumas mudanças têm sido
especuladas no futebol nas úl-
timas semanas pelo fato de as
competições estarem parali-
sadas em razão da pandemia
do novo coronavírus. Não há
qualquer certeza de como os
torneios vão voltar nesta tem-
porada. Até o presidente da
Fifa, Gianni Infantino, disse
que o momento pode ser pro-
pício para uma reforma glo-
bal da modalidade, com me-
nos jogos, clubes e disputas.
O Estado ouviu dirigentes,
treinadores e ex-jogadores para
saber quais os caminhos para o
futebol a curto, médio e longo
prazo. Entre possíveis mudan-
ças, personalidades divergem
quanto à unificação do calendá-
rio nacional com o europeu,
mas concordam que a Confede-
ração Brasileira de Futebol de-
veria ajudar clubes e atletas pa-
ra aliviar o impacto da crise.
O diretor executivo de fute-
bol do Grêmio, Klauss Câmara,
entende que a adaptação do ca-
lendário brasileiro ao do que es-
tá em vigência na Europa, que
começa em agosto e termina
em maio, seria positiva para ti-
mes e jogadores já neste ano.
“A unificação (dos calendá-
rios) seria um grande avanço,
ainda mais diante desse cenário
caótico causado pela pande-
mia. Poderíamos fazer, por
exemplo, um calendário de ju-
nho deste ano a maio do próxi-
mo”, avaliou o dirigente. Ele
acredita que as principais vanta-
gens das mudanças seriam a re-
dução do número de jogos, a am-
pliação do período de pré-tem-
porada e a possibilidade de reali-
zar vendas de jogadores em iní-
cio de disputa, o que traria au-
mento de receita com a perma-
nência de atletas importantes
até o fim da jornada no Brasil.
O diretor executivo do Inter-
nacional, Rodrigo Caetano, é
cauteloso. “Temos de levar em
conta as nossas peculiaridades,
nosso clima, aspectos cultu-
rais, férias coletivas. Tem de fa-
zer um estudo aprofundado.
Prefiro não opinar de forma su-
perficial sobre algo não experi-
mentado no Brasil”, disse o diri-
gente colorado.
Ex-técnico de Botafogo, San-
tos e Corinthians, Jair Ventura
endossa a análise de Klauss.
“Não sei o pensamento dos clu-
bes, mas se o modelo é a Euro-
pa, talvez seja melhor repensar
e ter essa mudança agora. Na
Argentina já é assim. Quando ti-
me brasileiro vai jogar a pré-Li-
bertadores, está com 15 dias de
pré-temporada enquanto um ti-
me chileno está no meio do
ano”, comparou o treinador,
que atualmente está sem clube.
O técnico René Simões, que
pegou coronavírus, mas já está
recuperado, acredita que a reali-
dade tanto no esporte, como
em outros segmentos da socie-
dade, não será mais a mesma a
partir de agora. “Vamos viver
um outro mundo, uma outra
realidade. Quem vai comprar jo-
gadores, por exemplo? O mun-
do vai estar detonado”, disse.
René é contra a equiparação
do calendário brasileiro ao da
Europa. “Nós vivemos em ou-
tro hemisfério. Culturalmente,
os jogadores (na Europa) estão
acostumados a jogar na época
de Natal, Ano Novo. Nós, não”.
Pentacampeão mundial com
a seleção brasileira em 2002,
Luizão apontou para a necessi-
dade de mudança na estrutura
do futebol, mas de forma grada-
tiva. “O coronavírus chegou e
agora é que vão falar em mudan-
ças? Tem de pensar bem antes
para programar o futebol. Não é
por causa da pandemia que tu-
do tem de ser mudado. É preci-
so mexer aos poucos”, disse o
ex-atacante de Corinthians, Pal-
meiras, São Paulo, entre outros.
No cenário de caos estimula-
do pelo coronavírus, os clubes
de futebol mais afetados são os
menores. Nessa realidade está
inserido o Santo André, time de
melhor campanha do Campeo-
nato Paulista e que ficará sem
95% do elenco entre abril e
maio, quando se encerram os
contratos dos atletas, da comis-
são técnica e até do diretor exe-
cutivo Edgard Montemor.
“Temos de mirar nossos es-
forços para sair dessa crise da
melhor forma possível para de-
pois a gente ver o que pode ser
feito. Unir forças é fundamen-
tal e os atletas não só olharem
para si. É hora de todo mundo
se unir para fazer o futebol me-
lhor”, disse Montemor, que cha-
mou a atenção para a necessida-
de de se criar um calendário ca-
paz de abranger os times de me-
nor expressão. “Todo mundo
cobra que os clubes sejam admi-
nistrados como empresas, mas
como se faz um planejamento
para uma competição de três
meses, sendo que depois, no
quarto mês do ano, tem de man-
dar todo mundo embora para
manter as contas em dia? Os clu-
bes vão se planejando de quatro
em quatro meses. Isso não é sau-
dável nem justo”, alerta.
Impacto econômico. Depois
de receber pedidos de ajuda de
clubes das Séries C e D, a CBF,
que registrou receita de R$ 957
milhões em 2019, anunciou no
começo da semana o repasse de
R$ 19 milhões, a fundo perdido,
para socorrer 68 times da Série
D e mais outros 20 da Série C do
Brasileiro, além de dar assistên-
cia a mais 52 times de futebol
feminino e às 27 federações.
Apesar do apoio, a entidade
tem sofrido críticas. “Está claro
que a CBF colabora pouco com
os clubes. Não tenho receio de
falar. Eles colaboram zero ou
quase nada. Você vê os clubes
clamando por um auxílio e a
CBF calada. Tem de se discutir
a verdadeira função da CBF. As
ligas estão ajudando os clubes
nos outros países e aqui nada”,
protestou Rodrigo Caetano.
Tatiana Weston-Webb aproveita quarentena menos
rígida na ilha para treinar forte visando à Olimpíada
Preconceito
cresceu 70%
nos estádios
Foco. Weston-Webb pode surfar, mas não consegue viajar
Botafogo alega ter três títulos
mundiais e deve ir à Fifa
O número de crimes discrimina-
tórios nos estádios de futebol
pelo Brasil cresceram 70% de
acordo com o novo levantamen-
to feito pelo Observatório da
Discriminação Racial no Fute-
bol. Os números mostram que
apesar do protocolo adotado pe-
la Fifa e também pela CBF, a par-
tir de 2018, prever punição aos
clubes diante dessas ações, as
medidas não têm mostrado efei-
to diante dos torcedores.
O levantamento inclui casos
de racismo, machismo e homo-
fobia nos estádios do País. Em
2018, foram registrados 88 ca-
sos. No ano passado, o número
saltou para 150 ações, uma dife-
rença de 62 casos. O relatório
ainda informa que o crescimen-
to maior é de racismo.
Os clubes podem ser multa-
dos e até perder pontos em com-
petições. O protocolo da CBF
se baseia no artigo 243-G do
Código Brasileiro de Justiça
Desportiva, que determina pu-
nições para “práticas ou ato dis-
criminatório, desdenhoso ou ul-
trajante, relacionado a precon-
ceito em razão de origem étni-
ca, raça, sexo, cor, idade, condi-
ção de pessoa idosa ou portado-
ra de qualquer deficiência.”
De acordo com o Observató-
rio da Discriminação Racial, os
casos estão espalhados por 16
Estados brasileiros, sendo que
o Rio Grande do Sul tem o
maior número de ocorrências:
- Na sequência estão São Pau-
lo e Rio. O estudo não levou em
consideração os casos de pre-
conceito pela internet.
O CEO do Comitê Organizador
dos Jogos Olímpicos de Tó-
quio, Toshiro Muto, disse não
ser possível garantir que o even-
to ocorra também em julho de
2021, nova data estipulada para
a disputa em função da imprevi-
sibilidade do novo coronavírus.
“Eu não acho que alguém pos-
sa dizer se será possível contro-
lar (a pandemia) em julho do
próximo ano ou não”, comen-
tou Toshiro, em entrevista cole-
tiva via videoconferência. “Cer-
tamente não estamos em posi-
ção de dar uma resposta clara
neste momento”, completou.
O Comitê Olímpico Interna-
cional (COI) e o Comitê Organi-
zador definiram que a Olimpía-
da será disputada entre os dias
23 de julho e 8 de agosto de 2021,
no mesmo período que seria rea-
lizada nesta temporada (24 de
julho a 9 de agosto). O mesmo
vale para a Paralimpíada, que co-
meçará em 24 de agosto e irá até
o dia 5 de setembro de 2021.
“Decidimos adiar os Jogos
por um ano. Isso significa que
só podemos agora trabalhar du-
ro na preparação do evento. Es-
peramos sinceramente que pa-
ra o próximo ano a humanidade
tenha sido capaz de superar a
crise da covid-19”, disse Muto.
Perguntado se havia planos al-
ternativos para os Jogos, o diri-
gente se esquivou. “Agora é o
momento em que devemos reu-
nir toda a tecnologia e sabedo-
ria para desenvolver tratamen-
tos, medicamentos e vacinas.”
ANDRE CALLADO
]O Botafogo passou a considerar os
títulos da Pequena Taça do Mundo de
1967, 1968 e 1970 como conquistas
mundiais e pretende ir à Fifa pedir a
validação dos torneiros. Com isso, o
clube alvinegro se tornaria tricam-
peão mundial, igualando o São Paulo.
Os torneios foram disputados em um
triangular que tiveram rivais convida-
dos e algumas seleções e não havia
entrega de taças.
PANDEMIA DO CORONAVÍRUS
Comitê Organizador não
garante os Jogos em 2021
BOTAFOGO DE FUTEBOL E REGATAS
PROJEÇÃO
DISCRIMINAÇÃO
Dirigente japonês diz que
é impossível assegurar
que a covid-19 estará
controlada em julho
do ano que vem
Coronavírus pode mudar o futebol
Klaus Câmara
DIRETOR DE FUTEBOL DO GRÊMIO
‘Poderíamos fazer,
por exemplo, um
calendário de junho
deste ano a maio
do próximo’
Surfe
150 ocorrências
de preconceito foram
registradas no ano
passado, contra 88 em 2018