matias

(Zelinux#) #1
MATIAS AIRES RAMOS DA SILVA DE EÇA

primeiro começam pela nossa incapacidade, do que por
nós mesmos; e nos nossos acertos a razão é a que
quase sempre tem menos parte. Só a vaidade não
enfraquece, por mais que o vigor nos falte; como se
fôra um afeto da alma independente da disposição do
corpo.

(33) Não temos alegria, se está descontente a vai-


dade; da mesma sorte, que a desgraça não aflige,
tanto, quando se acha a vaidade satisfeita. A mesma
morte não se mostra com igual semblante nos
suplícios; porque a qualidade dêles influi maior, ou
menos pena: por isso as honras do cadafalso servem de
alívio ao delinquente; porque a vaidade, que está
vendo a atenção do golpe, dêste esconde ao mesmo
tempo o horror, e entretida nos faustos do luto, desvia
da memória uma grande parte da consideração da
ruína.

(34) Para nada ser permanente em nós, até o ódio
se extingue: cansamo-nos de aborrecer: a nossa in-
clinação tem intervalos, em que fica isenta da sua
maldade natural: não esquece porém o ódio, que teve
por princípio vaidade ofendida; assim como nunca o
favor esquece quando se dirige, e tem por objeto a
vaidade de quem recebe o benefício. A nossa vaidade é
a que julga tudo: dá estimação ao favor, e regula os
quilates à ofensa: faz muito do que é nada: dos
acidentes faz substância: e sempre faz maior tudo o
que diz respeito a si. Nos benefícios pagamo-nos
menos da utilidade, que do obsé-

Free download pdf