MATIAS AIRES RAMOS DA SILVA DE EÇA
a ilusão delas, e se as buscamos, é como por costume,
mas sem ânsia e, sem desassossego; o desejo de as
alcançar, é como um resto de calor, que apenas se faz
sentir. Não refletimos sôbre o pouco tempo, que
devemos gozar um bem, senão depois de o ter: só
então consideramos o muito que custou a alcançar, e o
pouco que o havermos possuir. Em cada país há um
modo com que as coisas se imaginam; o que é fortuna
em uma parte, é desgraça em outra, o que aqui se busca
com empenho, ali se despreza totalmente. Os objetos
que entretêm a vaidade, estimação dos homens, são
como ídolos, que só se veneram em lugar determinado,
e fora daquele tal espaço, a adoração se troca em
vitupério: o mesmo mármore de que em Atenas se faria
uma Minerva, transportado a outro lugar, apenas
servirá de base a uma coluna, assim é a vaidade, por
mais que seja universal nos homens, os motivos dela
não são universais.
(57) É raro o mal, de que não venha a nascer algum
bem, nem bem, que não produza algum mal: como só
o presente é nosso, por isso não nos serve de alívio o
bem futuro nem nos inquieta o mal que ainda não
sentimos; um infeliz não se persuade, que a sua sorte
possa ter mudança; um venturoso não crê, que possa
deixar de o ser: a êste a vaidade tira o menor receio;
àquele o abatimento priva de esperança. Se fizermos
reflexão, havemos de admirar o pouco que basta para
fazer o nosso bem; ou o nosso mal: de um instante a
outro mudamos da alegria para a tristeza, e muitas
vêzes sem outro algum motivo, que o de uma vaidade
mais, ou menos satisfeita. Os homens não são todos
igualmente