matias

(Zelinux#) #1
REFLEXÕES SÔBRE A VAIDADE DOS HOMENS

são sagrados, no tempo de cumprir o que achamos, são
durezas; uma coisa nos inclina, a outra ofende-nos;
quando prometemos, ficamos bem conosco, por-que
nunca faltam agradecimentos e lisonjas, e por
consequência vaidades; quando havemos de cum-prir,
ficamos mal conosco, porque comumente nos
arrependemos. Que coisa é o arrependimento, senão
uma ira contra si próprio? Êste são os motivos de que
nasce a deslealdade nos contratos; e que poucos se
haviam de observar, se a vaidade que em tudo governa,
não nos obrigasse a guardar a fé nas nossas
convenções! Estas, quando se cumprem, não é por
vontade, mas por vaidade; como o nosso empenho é
conservar a estimação, e opinião dos homens, por isso
tememos que alguém diga, que mudamos, que faltamos
ao ajuste, e à palavra, ou que enganamos: tôdas estas
expressões infamam, porque contêm um caráter de
reprovação universal, trazem o desprêzo em
consequência, e se se justificam, fazem perder o nome
e o respeito, à maneira de uma proscrição, ou anátema
civil; por isso a vaidade se estremece, e nos obriga a
ser leais, por fôrça da nossa mesma vaidade. É justiça
rigorosa: de sorte que a vaidade sendo uma parte de
nós mesmos, contra nós mesmos se revolta e se dirige:
e assim são poucas as coisas que fazemos só pela
obrigação, que temos de as fazer; é necessário que
outro maior motivo nos incite; o que não fazemos pela
vaidade, e desta sorte tudo quanto obramos, é por um
princípio vicioso; o bem muitas vêzes desce de uma
origem má; a razão no homem é como um licor
precioso em um vaso impuro; o licor sempre se
contamina com a infecção do vaso; êste em nós é a
vaidade.

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