EM 15 DE ABRIL DE 1941, enquanto mais de metade da
Europa se debatia com uma guerra devastadora, as
preocupações das autoridades municipais de Lisboa
eram mais mundanas. Organizava-se então o concurso
de Montras Iluminadas, segundo dava conta a revista
“Mundo Gráfico”, numa altura em que duzentos esta-
belecimentos comerciais já dispunham «dos mais
modernos preceitos de uma boa iluminação», testemu-
nhando a «forma inteligente por que o comércio lisboeta
(...) tem conseguido a iluminação racional dos nossos
estabelecimentos». Os letreiros de néon triunfavam na
noite da capital, marcando uma época.
Em 2014, a designer Rita Múrias iniciou o levanta-
mento fotográfico das fachadas lisboetas, procuran-
do as marcas da diversidade tipográfica que, durante
o século XX, assinalaram o engenho de lojistas e ar-
quitectos em letreiros das mais diversas tipologias
- das letras de ferro forjado às fachadas pintadas,
incluindo o vidro e a madeira pintada, bem como o
emblemático néon. Com amargura crescente, aper-
cebeu-se de um processo de extinção acelerado: “Fo-
tografei o letreiro do Centro Comercial Palladium na
Avenida da Liberdade e, duas semanas depois, passei
por lá e ele já não existia. Esse padrão repetia-se se-
manalmente”, conta. Como todas as boas ideias, de-
cidiu num impulso que a mera documentação foto-
gráfica não chegaria. Estava em curso uma revolução
na reabilitação urbana da cidade que levaria, como
um deslizamento de terras, tudo à sua passagem.
Com o marido, Paulo Barata, igualmente designer,
Rita Múrias iniciou os esforços de recolecção, procu-
rando salvaguardar o que pudessem como despojos
de uma era perdida. “A primeira aquisição aconteceu
muito perto de nossa casa”, diz a designer. Havia uma
AS CIDADES MUDAM E REINVENTAM-SE, MAS A MUDANÇA COSTUMA SER SÚBITA E
DEIXA POUCOS VESTÍGIOS. DO ROSSIO DOS ANOS 1940, RESTAM APENAS AS MEMÓRIAS.
COLECÇÃO ESTÚDIO HORÁCIO NOVAIS, FUNDAÇÃO CALOUSTE GULBENKIAN /BIBLIOTECA DE ARTE E ARQUIVOS