REPENSANDO AS CIDADES 37
Está em curso uma mudança: em Santa Móni-
ca, conheci o arquitecto Johannes van Tilburg,
projectista de dez mil unidades de habitação jun-
to de linhas de transportes públicos nos últimos
15 anos. Poderá a malha urbana de uma cidade
em expansão mudar?
“Acho que a resposta é um sim categórico”, diz
Joe DiStefano. Demorámos apenas 50 anos a ar-
ruinar uma forma urbana pedonável que durara
milénios, comentou. Podemos desfazê-lo noutros
50 anos. Joe DiStefano trabalhou com Peter Cal-
thorpe no plano para El Camino. “Esse corredor
é replicável”, afirmou. Existe essa oportunidade
pelo país fora, a mesma oportunidade para criar
cidades pedonáveis e interligadas para alojar uma
população crescente, sem cortar mais uma árvore
ou asfaltar um único quilómetro adicional.
Antes disso, porém, haverá que contar com
a próxima nova tecnologia explosiva. Em últi-
ma análise, os veículos autónomos deveriam
ser mais seguros do que os conduzidos por seres
humanos. Deslocando-se em caravanas a 100
quilómetros por hora, quase em contacto com
os pára-choques uns dos outros, podem aumen-
tar a capacidade das vias rodoviárias e reduzir o
espaço necessário para estacionamento. No en-
tanto, segundo a mesma lógica, também podem
aumentar dramaticamente o número de quilóme-
tros percorridos por veículo: Uber e Lyft robóticos
vagueiam vazios pela metrópole 24 horas por dia,
à espera de um cliente e os proprietários de veícu-
los autónomos particulares deixam-nos a circular
enquanto vão às compras. Por fim, deveremos ter
em conta o novo ímpeto que os motoristas robó-
ticos poderiam injectar na expansão urbana. Se o
seu automóvel se transformar num escritório, ou
num quarto, que se conduz sozinho, qual a dis-
tância que estaria disposto a percorrer nele?
E se o seu carro fosse um avião? Num hangar
a sul de San José, tive um vislumbre de um futu-
ro que talvez não esteja muito distante. O hangar
pertence a uma empresa chamada Kitty Hawk e
continha quatro pequenas avionetas com alegres
fuselagens amarelas. Cada asa tinha seis propul-
sores eléctricos apontados para cima. A avioneta
chama-se Cora e levanta voo como um helicópte-
ro, deslocando-se graças a baterias. Tem dois lu-
gares, nenhum dos quais para um piloto. O Cora
pilota-se sozinho. Um piloto em terra controla a
viagem, assumindo remotamente os comandos
caso se torne necessário.
Fred Reid, antigo director-geral da Virgin
America, que supervisionou o Cora até ao iní-
cio deste ano, explicou a lógica subjacente aos
aviões autónomos. Começou por me mostrar
um vídeo do trânsito de Los Angeles. “Não há
dúvida de que isto não só vai acontecer como
tem de acontecer”, afirmou. A Kitty Hawk tem
numerosos concorrentes.
O mercado inicial do Cora seria como táxi aé-
reo, disse. Uma pessoa chegaria ao aeroporto e
um Cora erguê-la-ia 300 metros acima do trân-
sito, voando numa rota predeterminada. Relati-
vamente barato, disse, teria um custo mais apro-
ximado ao de um Uber Black do que ao de um
helicóptero. Eléctrico, seria silencioso e relativa-
mente ecológico. Além disso, acrescentou Reid,
“tentamos fazer aviões bonitos”. Ele imagina mi-
lhares deles nos céus da cidade.
Creio que eu não hesitaria em recorrer a esta so-
lução, mas como seria ter milhares destes veícu-
los a zunir pelo céu? Estamos a inventar uma nova
tecnologia com um potencial tão revolucionário
como os automóveis. Que tipo de mundo criará?
“Vamos descobrir a maneira de o fazer”, res-
pondeu Fred Reid.
TALVEZ SIM. Mas talvez seja sensato pensar nisso
primeiro. Não precisávamos de ter enlouquecido
com os carros, permitindo que fossem eles a man-
dar na vida da cidade. Não precisávamos de ter
arrancado todas as linhas dos eléctricos. Não pre-
cisávamos de nos esquecer que as cidades são
construídas para as pessoas e não precisamos de
fazê-lo novamente.
Quando Jan Gehl iniciou a sua carreira em
1960, Copenhaga também estava repleta de au-
tomóveis. Jan começou a trabalhar como arqui-
tecto de tradição modernista, desenhando o tipo
de edifícios que agora despreza, chamando-lhes
“frascos de perfume” – composições esculturais,
em vez de humanistas. No entanto, ele mudou
de rumo e a sua cidade também. Copenhaga
empenhou-se em tornar-se a melhor cidade do
mundo para peões e ciclistas e está a consegui-
-lo. Dois terços de todas as viagens diárias fa-
zem-se agora de bicicleta.
Isto não significa que as bicicletas sejam a solu-
ção. Significa que devemos pensar na forma das
nossas cidades. “Acordar todas as manhãs e saber
que a cidade está um pouco melhor do que on-
tem. Isso é bom quando temos filhos”, disse Jan.
“Pense nisso... Os seus filhos terão um sítio me-
lhor onde viver e os seus netos terão um sítio me-
lhor onde crescer do que você teve quando era pe-
queno. Acho que deveria ser esse o objectivo.” j