National Geographic - Portugal - Edição 231 (2020-06)

(Antfer) #1

Os cinco meses que se
seguiram foram um ponto de
viragem, para a Alemanha e para
Hans-Erdmann. Centenas de
milhares de soldados alemães
ficaram isolados. A situação
tornou-se desesperada no
Inverno, quando as temperaturas
desceram para níveis mortais.
Hans-Erdmann e os seus
homens demoliram casas e usaram
os materiais como lenha para se
aquecerem, expulsando os
moradores russos para a neve.
Com os tanques sem combustível
e os homens a morrerem de fome,


Hans-Erdmann encolheu,
deixando de ser um jovem cheio
de vigor para se tornar uma
sombra de 45 quilogramas. Foi
acometido por uma emoção
desconhecida: a dúvida.
Durante as noites frias, o jovem
oficial ouvia os seus homens
amaldiçoarem Hitler por tê-los
abandonado. Meses antes, tais
palavras teriam implicado a exe-
cução. Agora, porém, dava por si a
concordar com eles em silêncio.
No dia 19 de Janeiro de 1943,
Hans-Erdmann foi ferido por uma
salva de artilharia que lhe perfurou
os pulmões e estilhaçou o ombro.
Um sargento enfiou o jovem oficial
num bombardeiro alemão. Poucos
minutos depois, o avião levantou
voo e Hans-Erdmann foi um dos
poucos soldados alemães a
sobreviver a Estalinegrado.
A batalha assinalou o princípio do
colapso da Wehrmacht na Frente
Leste e do fim da Alemanha nazi.
Dez meses depois da sua fuga,
o jovem oficial foi destacado por
um breve período para orientar a
comitiva de Hitler nas ruas de
Breslau. Hans-Erdmann recorda-se
de correr para abrir a porta do
automóvel do Führer, perfilando-
-se em sentido e saudando Hitler
quando este saiu do carro.
Enquanto seguia Hitler até uma
sala de reuniões, os pensamentos
turvaram-se ao recordar as vidas
perdidas em Estalinegrado. Levou
a mão à pistola que trazia no
coldre e, de seguida, voltou a
lembrar-se de Estalinegrado.
“Pensei que me tinha sido dada
outra oportunidade de viver. Se o
fizesse, morreria e eles matariam
toda a minha família.”
Hans-Erdmann foi destacado
para uma unidade dos serviços
secretos no quartel-general de
Hitler. Certo dia, o seu comandante
fez-lhe uma pergunta estranha.
“Se algo importante acontecer,
podemos contar consigo, certo?”,
recorda. Soube mais tarde que os
oficiais preparavam uma conspira-
ção para assassinar Hitler. O sobre-
vivente de Estalinegrado guardou
segredo. “É o que acontece numa
ditadura”, diz. “Nunca se sabe em
quem confiar.” Quando a conspira-
ção fracassou, ocorreu uma purga
sangrenta. Depois da guerra, mudou-
-se para Munique e arranjou
emprego na indústria automóvel
alemã do pós-guerra. Foi subindo
na hierarquia e, na década
de 1980, foi director da Associação
Alemã da Indústria Automóvel.
“Sobrevivi”, diz. “Não ia desperdiçar
isso.” — Andrew Curry

HANS-ERDMANN
SCHÖNBECK


Oficial alemão


sobreviveu a uma das mais
sangrentas batalhas da história.
Olhou Adolf Hitler nos olhos.
Dormiu a poucos metros da
bomba que quase tirou a vida ao
Führer e escapou à purga
sangrenta que aconteceu a seguir.
Hoje com 98 anos, tem uma
única explicação. “Tive, ao longo
da minha vida, esquadrões de
anjos da guarda a velar por mim.
Só pode ter sido isso.”
Destacado para um regimento
de tanques alemão no Verão de
1940, Hans-Erdmann afirma ter
sentido que pertencia ao melhor
exército do mundo. Durante um
ano, a sua unidade atravessou a
União Soviética, deixando um
rasto devastador. Oito tanques
disparavam sob o seu comando e
ele foi recebendo sucessivas
promoções de combate. Quando
o seu tanque venceu uma colina
de onde se avistava Estalinegrado,
em Agosto de 1942, já chefiava
uma companhia inteira. Nem
sequer tinha 20 anos.


MALLIE
MELLON

Construtora de aviões
de guerra dos EUA
NASCIDA NUMA quinta do
Kentucky, Mallie Osborne Mellon,
juntamente com o marido e o seu
jovem filho, embarcou num
autocarro rumo a Detroit em 1943,
em resposta a um anúncio
radiofónico de empregos para
civis em tempo de guerra. Por essa
altura, já mais de trezentas mil
mulheres norte-americanas
participavam no fabrico de
aeronaves, muitas das quais
cravando rebites em aviões de
guerra nas fábricas da cidade.
Mallie foi trabalhar para a Briggs
Manufacturing, polindo peças
para os bombardeiros que saíam
da linha de montagem da
gigantesca fábrica de Henry Ford
situada em Willow Run.
Actualmente com 100 anos,
Mallie nunca ouvira falar no termo
“Rosie Rebitadora”, utilizado para
descrever as mulheres que
trabalhavam nas fábricas da
indústria de defesa. Há cinco anos,
explicaram-lhe que ela tinha sido
uma dessas operárias. Hoje
frequenta as reuniões da
Associação Americana das Rosies
Rebitadoras. Ainda preserva
o seu sotaque sulista arrastado,
mas o Michigan é o seu lar
e as Rosies são como se fossem
família. — Katie Sanders
Free download pdf