O Estado de São Paulo (2020-06-21)

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O ESTADO DE S. PAULO DOMINGO, 21 DE JUNHO DE 2020 Economia B3


PANDEMIA DO CORONAVÍRUS Cabotagem cresce mesmo com crise. Pág. B4 }


Mônica Scaramuzzo


O risco de perder mercado no
exterior, por conta da ima-
gem arranhada do Brasil, co-
locou em alerta agroindús-
trias e grandes produtores de
grãos no País. Em meio à pan-
demia do coronavírus, inves-
tidores estrangeiros, sobretu-
do da Europa, ameaçam não
comprar produtos brasilei-
ros por conta do alto índice
de desmatamento
.
“De fato, tem se instalado no
governo uma visão extrema-
mente antiga, que o ministro
(Ricardo) Salles representa, de
um discurso mais agressivo,
que agrada à ala mais radical do
governo”, diz o economista Jo-
sé Roberto Mendonça de Bar-
ros, sócio da MB Associados.
Duas agendas diferentes pau-
tam atualmente o agronegócio,
de acordo com especialistas ou-
vidos pelo Estadão. De um la-
do, uma ala mais “ideológica” e
considerada radical, represen-
tada pelo ministro Ricardo Sal-
les (Meio Ambiente), e outra
que prega conceitos mais libe-
rais e é pragmática, integrada
pela ministra da Agricultura, Te-
reza Cristina.
“Aí tem racha mesmo. Não é a
única pasta ( do governo ) em que
aparece essa dicotomia. Tem a
educação e o comércio exte-
rior. Mas a agricultura é o único
segmento da economia que es-
tá crescendo. É um embate sé-
rio e que pode nos custar bastan-
te”, diz Mendonça de Barros.
Para Mendonça de Barros, o
tema de desburocratização do
setor, que deu origem à fala da
“boiada” do ministro Salles e ge-
rou a mais recente polêmica no
setor, merece atenção, mas não
é o principal gargalo.
“O grosso dos agricultores es-
tá mais alinhado com a ministra
e o que ela representa. Não pre-
cisa queimar um hectare de flo-
resta para aumentar a produção
agrícola e atender à demanda
crescente aqui e lá fora. A ques-
tão da sustentabilidade virou
um tema do mundo, não só da
Europa”, diz.
Parte dos agricultores e da
agroindústria ouvidas pelo Es-
tadão
, sob condição de anoni-
mato, teme que a ministra da
Agricultura perca força, por
conta da pressão, para a ala
mais radical do governo.
O secretário especial de As-
suntos Fundiários do Ministé-
rio da Agricultura, Nabhan Gar-
cia, vê exagero nessas preocupa-
ções e diz que o Brasil não pode
entrar “nas maluquices de
ONGs.” Garcia representa uma
ala mais alinhada a Bolsonaro.


Moeda política. Para o presi-
dente da Frente Parlamentar da
Agricultura, deputado federal
Alceu Moreira (MDB-RS), não
há agronegócio rachado. Segun-
do ele, em um setor do tamanho
do agro brasileiro, que tem 47
instituições, não há unanimida-
de. “Tem muito ambientaloide
querendo dar uma carga ideoló-
gica para este processo. Pode
ter discordância em alguns te-
mas, mas não racha.”
O agro brasileiro, segundo o
parlamentar, tem de ser visto da-
qui para a frente como uma moe-
da política, assim como o petró-
leo é para a Arábia Saudita. “Nin-
guém consegue sentar para dis-
cutir segurança alimentar para
as próximas duas décadas sem
trazer o Brasil para a mesa. Isso
incomoda muita gente.”
Tema caro ao agronegócio, a
crise diplomática com a China,
principal importador de produ-
tos nacionais, será discutida en-
tre parlamentares e represen-
tantes do Instituto Pensar Agro
no próximo dia 30. “A China


não vai deixar de comprar do
Brasil por fuxicos laterais. Se
tem de fazer uma crítica a posi-
ções de membros do governo à
China, vai ser feita de maneira
muito clara”, diz Moreira.

Procurados para comentar o
assunto, os ministros da Agri-
cultura, Tereza Cristina, e do
Meio Ambiente, Ricardo Salles,
não retornaram os pedidos de
entrevista.

TIAGO QUEIROZ/ESTADÃO - 13/10/2015

‘Ideológicos’ e


liberais disputam


espaço no governo


Segundo economista, dicotomia está presente em outras áreas,


mas fica mais evidente na agricultura pela importância econômica


Situação. Parte dos agricultores teme perder mercado por conta de disputas ideológicas
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