National Geographic - Portugal - Edição 232 (2020-07)

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portante descoberta da equipa de investigação da
Universidade James Cook e colocou a Asparagop-
sis taxiformis na boca do mundo. Seria possível
cultivar esta espécie em larga escala? Kinley foi
rápido a alertar que a Asparagopsis taxiformis não
é abundante nem disponível no mercado. Para ser
uma solução válida para a redução das emissões
de metano, teria de ser cultivada industrialmente.
Kinley acrescentou ainda que não existe qualquer
conhecimento sobre o cultivo em larga escala de
Asparagopsis taxiformis.
Profundamente enraizada na cultura asiática,
a utilização de macroalgas marinhas na rotina
alimentar exige que a sua produção seja cada vez
maior, mais eficaz e diversificada. Entre 2005 e
2015 a produção mundial de macroalgas aumen-
tou de 13,5 milhões para 29,4 milhões de toneladas
anuais. Mas se o cultivo de macroalgas marinhas
em larga escala é uma realidade consolidada, o
cultivo da espécie em foco é mais desafiante e é
aqui que Portugal tem um papel preponderante.
Os únicos artigos científicos sobre a produção
de Asparagopsis são da autoria de um investiga-
dor português. Durante o seu doutoramento, en-
tre 2004 e 2008, Leonardo Mata desenvolveu um
sistema experimental de cultivo de macroalgas
em tanques, integrado com uma piscicultura, e
debruçou-se sobre o estudo das condições ópti-
mas para a produção de biomassa de Asparagop-
sis e seus produtos naturais com valor comercial
(como o bromofórmio).
O sucesso da investigação e os elevados níveis
de produção de Asparagopsis levaram Leonardo
à Universidade James Cook, bem longe de sua
casa. Um equipa de investigação desta univer-
sidade estava então a dar os primeiros passos
para o desenvolvimento de sistemas de cultivo
de macroalgas em tanques e Leonardo Mata teve
um papel fundamental para estabelecer os siste-
mas que mais tarde serviram de base à investi-
gação que colocou a espécie na boca do mundo.
O mundo assistia ao início de mais uma impor-
tante corrida científico-comercial e Leonardo
Mata acumulava mais de dez anos de investiga-
ção com a Asparagopsis.
Requisitado por vários investidores e empresas
interessadas em dominar o cultivo desta espécie,
Leonardo Mata estabeleceu uma parceria com o

No interior de uma
câmara de incubação na
Universidade do Algarve,
as algas são submetidas a

condições ambientais
específicas para
crescerem e
produzirem esporos.

Quando Kinley foi chamado para trabalhar na
Organização de Investigação da Commonwealth
Scientific para a Pesquisa Industrial, em parceria
com a Meet & Livestock Australia e com a Univer-
sidade James Cook, na Austrália, a descoberta que
fizera no Canadá e o artigo científico que publicou
em 2013, onde foi provado pela primeira vez o efei-
to antimetanogénico de algas, despertaram gran-
de interesse sobre o assunto e um novo estudo foi
desenvolvido por uma equipa multidisciplinar da
universidade australiana. Entre verdes, castanhas
e vermelhas, vinte espécies de macroalgas tropi-
cais foram trazidas a laboratório com o intuito de
testar o efeito de cada uma na inibição da produ-
ção de metano durante o processo de digestão.
Os resultados foram ainda mais categóricos.
Entre as espécies ensaiadas, uma alga vermelha
mostrou claramente ser a mais poderosa solução
para o problema de emissão de metano: a Aspa-
ragopsis taxiformis, nos ensaios in vitro, surpreen-
deu toda a equipa com taxas de inibição de meta-
no de 98,9%. Ao contrário dos resultados obtidos
com outras espécies, que se mostravam bastante
ineficazes quando aplicadas em doses baixas, a
Asparagopsis mantinha a eficácia quando aplica-
da em doses inferiores a 2% (matéria seca) da ra-
ção total fornecida por animal, ao fim de 72 horas
de incubação.


I


MAGINE UMA BAÍA AMPLA, protegida
por um colar de ilhas que amparam a
energia inquieta das ondas que nas-
cem no mar alto. No mar espelhado,
abriga-se um sistema de cordas flu-
tuantes que dança tranquilamente a
cerca de oito milhas da costa vietnamita. À superfí-
cie, descobrem-se apenas os flutuadores que sustêm
as cordas submersas. A meia água, para dar corpo à
dança, existe uma exuberante floresta de biomassa
vermelha a que o mar se vai encostando.
Em terra, um grupo de mulheres arremata em
polvorosa a secagem das algas já colhidas, en-
quanto as outras preparam mais umas dezenas de
metros de cordas que serão o substrato do próxi-
mo ciclo do cultivo de Asparagopsis. O cultivo des-
ta espécie tem potencial para constituir um modo
de vida alternativo para comunidades costeiras
da Ásia. Esse foi durante muito tempo o idílico
sonho que comandou os avanços da investigação
que acaba de deixar em mar aberto uma semente
que poderá revolucionar toda uma indústria.
A publicação do artigo científico de Lorenna
Machado, em Janeiro de 2014, disseminou a im-

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