POR UMA OUTRA GLOBALIZAÇÃO (do pensamento único à consciência universal) Milton Santos

(mariadeathaydes) #1

histórico.
O sistema de produção que se serve desse espaço de fluxos é constituído por redes – um
sistema reticular -, exigente de fluidez e sequioso de velocidade. São os atores do tempo rápido, que
plenamente participam do processo, enquanto os demais raramente tiram todo proveito da fluidez.
Tais espaços de fluxos vivem uma solidariedade do tipo organizacional, isto é, as relações que
mantêm a agregação e a cooperação entre agentes resultam em um processo de organização, no
qual predominam fatores externos às áreas de incidência dos mencionados agentes. Chamemos
macroatores àqueles que de fora da área determinam as modalidades internas de ação. É a esses
macroatores que, em última análise, cabe direta ou indiretamente a tarefa de organizar o trabalho de
todos os outros, os quais de uma forma ou de outra dependem da sua regulação. O fato de que cada
um deva adaptar comportamentos locais aos interesses globais, que estão sempre mudando, leva o
processo organizacional a se dar com descontinuidades, cujo ritmo depende do número e do poder
correspondente a cada macroagente.
Por intermédio dos mencionados pontos do espaço de fluxos, as macroempresas
acabam por ganhar um papel de regulação do conjunto do espaço. Junte-se a esse controle a ação
explícita ou dissimulada do Estado, em todos os seus níveis territoriais. Trata-se de uma regulação
freqüentemente subordinada porque, em grande número de casos, destinada a favorecer os atores
hegemônicos. Tomada em consideração determinada área, o espaço de fluxos tem o papel de
integração com níveis econômicos e espaciais mais abrangentes. Tal integração, todavia, é vertical,
dependente e alienadora, já que as decisões essenciais concernentes aos processos locais são
estranhas ao lugar e obedecem a motivações distantes.
Nessas condições, a tendência é a prevalência dos interesses corporativos sobre os
interesses públicos, quanto à evolução do território, da economia e das sociedades locais. Dentro
desse quadro, a política das empresas – isto é, sua policy – aspira e consegue, mediante uma
governance, tornar-se política; na verdade, uma política cega, pois deixa a construção do destino de
uma área entregue aos interesses privatísticos de uma empresa que não tem compromissos com a
sociedade local.
Na situação acima descrita, instalam-se forças centrífugas certamente determinantes,
com maior ou menor força, do conjunto de comportamentos. E, em certos casos, quando conseguem
contagiar o todo ou a maioria do corpo produtivo, tais forças centrífugas são, ao mesmo tempo,
determinantes e dominantes. Tal dominância é também portadora da racionalidade hegemônica e
cujo poder de contágio facilita a busca de uma unificação e de uma homogeneização.
As frações do território que constituem esse espaço de fluxos constituem o reino do
tempo real, subordinando-se a um relógio universal, aferido pela temporalidade globalizada das
empresas hegemônicas presentes. Desse modo ordenado, o espaço de fluxos tem vocação a ser
ordenador do espaço total, tarefa que lhe é facilitada pelo fato de a ele ser superposto.
O modelo econômico assim estabelecido tende a reproduzir-se, ainda que mostrando
topologias específicas, ligadas à natureza dos produtos, à força das empresas implicadas e à
resistência do espaço preexistente. O modelo hegemônico é planejado para ser, em sua ação
individual, indiferente a seu entorno. Mas este de algum modo se opõe à plenitude dessa hegemonia.
Esta, porém, é exercida em sua forma limite, pois a empresa se esforça por esgotar as virtualidades e
perspectivas de sua ação “racional”. O nível desse limite define a operação respectiva do ponto de
vista de sua rentabilidade, comparada à de outras empresas e de outros lugares. Se considerada

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