pretende assumir o controle desse componente central da economia brasileira. O governo rebate
veementemente essas conclusões. Se elas estiverem certas, estaremos diante de uma situação
bastante familiar.^7
Um comentário à margem: comunicações não são a mesma coisa que urânio. A concentração
dos meios de comunicação nas mãos de quem quer que seja (particularmente estrangeiras) suscita
sérias questões sobre a democracia significativa. Essas mesmas questões surgem quando se fala de
concentração financeira, que prejudica a participação popular no planejamento social e econômico.
O controle dos alimentos suscita questões ainda mais sérias; de sobrevivência, no caso. Há cerca de
um ano, discutindo a “crise alimentar que se seguiu ao brutal aumento dos preços dos cereais”, o
secretário-geral da FAO, órgão das Nações Unidas para os Alimentos e a Agricultura, advertiu que
os países “devem se tomar mais autônomos na produção de alimentos”.^8 A FAO está alertando os
“países em desenvolvimento” para que revertam as políticas que lhes foram impostas pelo Consenso
de Washington, políticas que tiveram impacto desastroso na maior parte do mundo, ao mesmo
tempo que se revelavam como uma grande dádiva para o agronegócio subsidiado – por acaso
também para o narcotráfico, talvez o mais espetacular sucesso das reformas neoliberais a julgar
pelos “valores do livre mercado” que os “Estados Unidos estão exportando”.
O controle da oferta de alimentos pelas mega-empresas estrangeiras é um processo em pleno
andamento; com o acordo sobre as telecomunicações assinado e publicado, os serviços financeiros
são os próximos da fila.
Em resumo, os resultados esperados da vitória dos “valores americanos” na OMC são:
- Um “novo instrumento” de longo alcance para a intromissão dos EUA nos assuntos internos de outros
países. - A tomada de uma parte essencial das economias estrangeiras por empresas sediadas nos Estados
Unidos. - Vantagens para o setor empresarial e para os ricos.
- Transferência de custos para a população em geral.
- Armas novas e potencialmente poderosas contra a ameaça democrática.
Uma pessoa racional estaria se perguntando se essas expectativas têm algo a ver com aquelas
comemorações ou se são apenas o pano de fundo de uma vitória de princípio celebrada em atenção
a valores mais elevados. O ceticismo cresce quando comparamos o quadro do pós-guerra pintado na
primeira página do Times, citado no início, com os fatos incontestes. E aumenta ainda mais quando
observamos algumas notáveis regularidades históricas: dentre elas, a de que aqueles que têm
condições de impor seus projetos não apenas os aclamam com entusiasmo, como também
geralmente se beneficiam deles, quer os valores preconizados envolvam o livre comércio ou outros
princípios básicos que, na prática, acabam se revelando ao final como afinados com as
necessidades dos que mandam no jogo e batem palmas na hora do resultado. A simples lógica
sugere um toque de ceticismo diante da repetição desse padrão. A História devia elevá-lo um ponto
mais acima.
Na verdade, nem precisamos procurar tão longe.