Chomsky_Noam_-_lucro_ou_as_pessoas

(mariadeathaydes) #1

Tirando as conclusões naturais sobre a inconfiabilidade do mundo, Sofaer prosseguiu
explicando que devemos agora “reservar-nos o poder de determinar se a Corte tem jurisdição sobre
nós em um determinado caso”. O princípio há muito existente, a ser agora imposto a um mundo
que já não é obediente o bastante, é que “os Estados Unidos não aceitam jurisdição compulsória
sobre nenhuma disputa que envolva assuntos essencialmente pertinentes à sua jurisdição interna,
tal qual eles mesmos definiram”. ‘Os “assuntos internos” em questão eram o ataque norte-
americano contra a Nicarágua.^12
O princípio operativo básico foi elegantemente apresentado pela nova Secretária de Estado,
Madeleine Albright, quando discursou no Conselho de Segurança da ONU sobre a relutância deste
em aceitar as exigências norte-americanas a respeito do Iraque: os Estados Unidos “se comportarão
multilateralmente quando puderem e unilateralmente quando precisarem”, ignorando todas as
restrições externas numa área considerada “vital para os interesses nacionais norte-americanos” –
tal como definidos pelos Estados Unidos)3 A ONU é um fórum apropriado quando se pode “contar
com os seus membros” para compartilhar os pontos de vista de Washington, mas não quando a
maioria “se opõe aos Estados Unidos em importantes questões internacionais”. As leis
internacionais, como a democracia, são coisas ótimas – a julgar pelo resultado, não pelo processo,
da mesma forma que o livre comércio.
A posição atual dos Estados Unidos na questão da OMC não contém, portanto, nenhuma
novidade. Washington declarou que a OMC “não tem competência para atuar” numa questão que
envolve a segurança nacional norte-americana; devemos compreender que é a nossa existência que
está em jogo quando se trata do estrangulamento da economia cubana. Uma decisão da OMC
contra os Estados Unidos in absentia não significa nada e nem é motivo de preocupação, disse um
porta-voz do governo Clinton, porque “não acreditamos que qualquer coisa que a OMC diga ou faça
possa obrigar os Estados Unidos a mudar as suas leis”. Lembremo-nos de que o grande mérito do
acordo da OMC sobre as telecomunicações foi que esse “novo instrumento de política externa”
obriga os outros países a mudar suas leis e suas práticas de acordo com as nossas demandas.
O princípio é o de que os Estados Unidos estão livres da intromissão da Organização Mundial
de C9mércio em suas leis, da mesma forma como estão livres para violar as leis internacionais ao
seu bel-prazer; exclusivamente, embora tal privilégio possa ser estendido a Estados clientes quando
as circunstâncias assim o exigirem. Os princípios fundamentais da ordem mundial, mais uma vez,
ressoam alto e claro.
Os primeiros acordos do GATT permitiam exceções de segurança nacional, graças às quais
Washington justificou o seu embargo a Cuba como “medidas tomadas em nome dos interesses
vitais da segurança dos Estados Unidos”. O acordo da OMC também permite que um país-membro
tome “qualquer atitude que considerar necessária para a proteção dos interesses vitais da sua
segurança”, mas apenas em relação a três áreas específicas: materiais físseis, tráfico de armas e
ações “executadas em tempo de guerra ou outra situação de emergência nas relações
internacionais”.^14 Talvez por não querer ficar oficialmente relacionado a um tal absurdo, o governo
Clinton deixou de invocar formalmente a sua “isenção de segurança nacional”, embora deixasse
claro que a questão era de “segurança nacional”.
No momento em que escrevo, a União Européia e os Estados Unidos estão tentando chegar a
um acordo antes de 14 de abril, quando começam as audiências da OMC. Enquanto isso, o Wall

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