antes da data fixada para o ano de 1998. Ele limita a sua cobertura a alguns poucos comentários
oficiais vazios, apresentados como fatos indiscutíveis, e acrescenta que o governo “aprendeu com o
Fast Track que precisa consultar, mais do que nunca – e durante a elaboração dos acordos –, os
sindicatos, as autoridades locais, os ambientalistas e outros”, como já tivemos ocasião de
comentar.^86
Talvez por causa da carta dos congressistas ou porque os excêntricos saíram à luz,
Washington divulgou uma declaração oficial sobre o AMI em 17 de fevereiro de 1998. A declaração,
do Subsecretário de Estado, Stuart Eizenstat, e do delegado para assuntos comerciais dos Estados
Unidos, Jeffrey Lang, foi ignorada pela mídia até onde é do meu conhecimento. Foi uma declaração
morna, mas que merecia títulos de primeira página, considerando o que fora publicado até então
(fundamentalmente nada). As virtudes do AMI são apresentadas como evidentes por si mesmas; não
há nenhuma descrição ou discussão. Em questões como trabalho, meio ambiente, “ingressos” etc.,
a mensagem é igual às divulgadas pelos governos do Canadá e da Austrália: “Confiem em nós e
fiquem calados”.
Mais interessante ainda é a boa notícia de que os Estados Unidos tomaram a iniciativa na
OCDE de assegurar que o acordo “complemente os nossos amplos esforços”, até aqui
desconhecidos, “em defesa do desenvolvimento sustentável e do respeito aos padrões de trabalho”.
Eizenstat e Lang “congratulam-se com o fato de os participantes concordarem conosco” nessas
questões. Além disso, os demais países-membros da OCDE agora “concordam conosco a respeito da
importância de trabalhar em estreita colaboração com seus públicos internos para construir o
consenso” em tomo do AMI. Eles se juntam a nós na compreensão “de que é importante para os
seus respectivos públicos internos ter alguma participação nesse processo”.
“Visando maior transparência”, acrescenta a declaração do governo, “a OCDE concordou em
tomar pública a minuta do acordo”, talvez até antes da data-limite para a sua assinatura.^87
Temos aqui, enfim, um “retumbante atestado” de democracia e direitos humanos. O governo
Clinton é o líder mundial, proclama, do movimento para garantir que os “públicos internos” joguem
um papel ativo na “construção do consenso” em tomo do AMI.
Mas quem é o “público interno”? Para responder a essa pergunta basta dar uma olhada nos
fatos incontestes. Em toda parte, o mundo dos negócios teve um papel fundamental. O Congresso
não foi informado, e o público importuno – a “arma definitiva” – foi deixado na ignorância. Um
simples exercício de lógica elementar nos diz com exatidão o que o governo Clinton considera ser o
“público interno”.
É uma útil lição. Os valores práticos dos poderosos raramente são expressos com tanta
franqueza e precisão. Para sermos justos, esses valores não são monopólio dos Estados Unidos. São
compartilhados pelos centros de poder estatal-privados em outras democracias parlamentares e por
seus congêneres em sociedades em que não existe necessidade de se perder tempo com floreios
retóricos sobre a “democracia”.
São lições claras como água. É preciso ter muito talento para não entendê-las e não enxergar
o quanto elas ilustram bem as advertências de Madison há mais de duzentos anos, quando
deplorava a “ousada depravação dos tempos que correm”, em que “os especuladores se tomarão a
guarda pretoriana do governo seus instrumentos e seus tiranos seduzidos por suas liberalidades e
intimidando-o com clamores e conluios”.
mariadeathaydes
(mariadeathaydes)
#1