14 A BOLA
Quarta-feira
9 de setembro de 2020
BENFICA jENTREVISTA
Futebol
Aos 64 anos o gestor
e professor universi-
tário, ex-vice presidente do
Benfica, formaliza a criação do
movimento ‘Benfica Bem
Maior’. Não pretende ir (já) a
eleições, apresenta antes um
debate de ideias para o futu-
ro, defendendo a internaciona-
lização como forma de sobre-
vivência. Gestão rigorosa,
desportiva e não só, é o mote.
«Missão é ajudar a melhorar o Benfica
ganhe quem ganhar as eleições»
D
UAS questões: que mo-
vimento é este, Benfi-
ca Bem Maior, e porque
aparece agora, a pou-
co mais de um mês das
eleições?
— É um movimento de benfi-
quistas preocupados em melhorar as
coisas no Benfica, em tornar o Ben-
fica maior. Da análise que fazemos,
o Benfica só pode crescer para fora
do País, crescer internacionalmen-
te. Este movimento não apareceu
agora: começou mal acabou o con-
finamento, no início de junho, quan-
do o único candidato previsível na
altura era o dr. Rui Gomes da Silva.
Começamos na sequência de uma
época desportiva que achamos que
foi muito má, e olhávamos para trás
com o sentimento de que nos últi-
mos anos as coisas não têm sido
boas, mas o Benfica pode fazer me-
lhor e a ideia subjacente foi: ‘O que
é que podemos fazer para ajudar o
clube’. Não pensamos em eleições.
Aquilo que achamos é que apesar
do ciclo desportivo menos bom nos
últimos três anos, isso não põe em
causa tudo o que de bom que foi fei-
to para trás. É bom perceber-se que
de um clube falido as várias direções
deste presidente trouxeram ao Ben-
fica uma situação líquida de €
milhões. Hoje o Benfica tem patri-
mónio, não tinha nenhum antes.
Tanto património físico como patri-
mónio de produção de talento, que
também não tinha. O curto prazo
Entrevista de
PAULO ALVES
não correu bem, mas a nossa preo-
cupação não é de curto prazo. O que
entendemos é que o Benfica deve
resolver os problemas estruturais
para se internacionalizar de forma
definitiva e decisiva. A estratégia
não pode ser errática, tem de ser
firme e que tenha como ponto nú-
mero 1 a internacionalização em to-
dos os aspetos que isso implica.
— O objetivo não é, portanto, ir
a eleições...
— Dentro do nosso grupo hou-
ve quem defendesse que devíamos
formar uma lista e apresentar uma
candidatura. Mas a ideia é ajudar a
melhorar o Benfica ganhe quem ga-
nhar as eleições. Até admitimos que
no futuro deste grupo possa sair
uma candidatura. Não agora... Ago-
ra só em circunstâncias muito es-
peciais... só se caísse o céu e a ter-
ra, em caso de uma emergência.
Mas não me parece que se justifique
João Braz Frade e Manuel de Brito (filho de Jorge de Brito) lideram novo movimento
com cinco candidaturas aparecer
mais uma. Estamos há três meses a
estudar o Benfica. Vamos continuar
o nosso trabalho, agora e depois das
eleições, e estamos disponíveis para
tudo, para conversar seja com quem
for, sejam listas da oposição ou da
atual direção.
AUMENTAR RECEITAS
EM 50%
— E acredita que poderá haver
uma boa aceitação das ideias que
trazem a público?
— Esperamos que sim, gostáva-
mos disso. Vamos agora tornar este
projeto público e veremos as reações
e se alguém quer aproveitar algu-
ma coisa ou não.
— Qual é, então, a linha estra-
tégica defendida para o Benfica?
— Achamos que é possível, mes-
mo em contexto Covid, aumentar
a receita direta de exploração, ou
seja sem contar com venda de jo-
gadores, em 50 por cento. Vamos
por partes: em 2024 prevê-se uma
alteração significativa nos quadros
competitivos da UEFA. Essas mo-
dificações irão dar mais peso à com-
ponente internacional do que às
vertentes nacionais. Somado à cen-
tralização dos direitos televisivos
em Portugal, o que provocará pre-
visivelmente quebra de receita para
os três grandes, isto leva a que cada
vez mais a componente interna-
cional da receita seja cada vez mais
importante. Para um clube como o
Benfica é difícil crescer mais em
Portugal, tem de ir para fora. Isso
faz-se de várias maneiras, a mais
óbvia (e aqui é importante dizer
que o Benfica já tem muito traba-
lho feito) é o crescimento no digi-
tal, não cá dentro mas a nível inter-
nacional. Só para se ter uma ideia,
o Barcelona na área de ga m i ng nos
próximos cinco anos conta faturar
€300 milhões de euros. Achamos
que é possível no Benfica em cinco
anos, embora o efeito Covid afete
um pouco isso, fazer crescer as re-
ceitas em 50%.
— Que implicações terá no inves-
timento na vertente desportiva, no
futebol?
— O Benfica tem de ter uma
equipa competitiva na Champions,
isso é ponto assente. Só assim atrai
público também a nível interna-
cional. Por outro lado, o Benfica
deve olhar para a possibilidade de
adquirir clubes no estrangeiro, em
particular em Inglaterra e Espanha.
Porque com a academia que nós te-
mos — uma boa academia como já
toda a gente percebeu — se ela pro-
duzir dois jogadores por ano para a
primeira equipa, todo o restante ta-
lento está disponível e os jogadores
para serem valorizados podem ro-
dar em ligas que sejam competiti-
vas. Seria um investimento que se
pagaria a si próprio com muita fa-
cilidade. Há clubes em Inglaterra e
até em Espanha que têm cinco e
D.R.
j
BRAZ FRADE
seis emblemas em outras ligas. De-
pois há, ainda, toda a envolvência
relacionada com o digital: a criação
do sócio digital, o adepto digital, o
gaming, o aparecimento de novos
operadores como a Amazon, Netflix,
Facebook ou o Google interessados
em conteúdos do tipo que o Benfi-
ca produz, o crescimento no seg-
mento jovem utilizando as platafor-
mas sociais, o Youtube, o Wave, Tik
Tok, Twitter, Instagram. E encon-
trar modelos de rentabilização de
tudo isto, disponibilizando tam-
bém o merchandising a nível in-
ternacional. Há algo também a que
damos muita importância, o con-
ceito do valor partilhado: as gran-
des empresas mundiais não podem
mais trabalhar em função do pro-
pósito único de ganhar dinheiro.
As empresas têm cada vez mais um
papel social fundamental, seja na
relação com o ambiente (energias
limpas, etc) seja em função das so-
ciedades em que se inserem. Este
tipo de valores tem de estar pre-
sente nas preocupações do Benfica.
O crescimento internacional é fei-
to à custa de jovens e estes são os te-
mas que estão na agenda dos mais
jovens. Eles vão preferir clubes que
se interessem por estes temas, pelo
ambiente, pela igualdade, para além
da performance desportiva, que
essa é prioritária... e isso que fique
bem claro: é a reboque do futebol,
de uma boa equipa de futebol que
toda a estratégia assenta. Por isso te-
mos de encontrar soluções que per-
mitam ganhar dinheiro e ao mes-
mo tempo cumprir um papel social
relevante. Aquilo que queremos é
um clube no topo da gestão, não
apenas no topo a nível desportivo.
— Isso é possível mediante o atual
modelo das sociedades desporti-
vas, como a do Benfica, cuja maio-
ria do capital pertence ao clube?
— O defeito não está nas socie-
dades desportivas, está gestão de-
las. Os gestores destas sociedades
têm de convencer-se de uma vez
por todas que o papel deles, além da
promoção da performance despor-
tiva, tem de passar pelo desenvol-
vimento das sociedades onde es-
tão integrados, seja zelando pelo
ambiente, pelas boas práticas de
gestão, integração social, etc. É tudo
isso junto que capta o interesse, o
apoio, dos segmentos mais jovens
da população que quer ver o seu
clube ganhar e ao mesmo tempo
fazer o bem.
Acredito que em
próximas eleições saia
deste grupo uma lista.
Até lá queremos ajudar