Claude Lévi-Strauss - As estruturas elementares do parentesco (1982, Editora Vozes) - libgen.lc

(Flamarion) #1

tura consecutiva a proibições maciças não parece poder evitar que um
certo parentesco apareça entre os cônjuges, desde que o sistema tenha
regularmente funcionado durante o lapso de várias gerações. Será isso
verdade, e, caso afirmativo, que forma tem este vestígio e qual é o afas·
tamento médio do grau? Eis aí um certo número de questões de grande
interesse teórico, mas difíceis de responder por motivos que devemos
agora determinar com exatidão.


Quando se estudam os sistemas de classes matrimoniais (sem dar
sentido demasiado técnico a esta noção), é sempre possível e geralmente
fácil definir tipos de casamento. Cada tipo será representado pela união
de um homem de uma classe determinada com uma mulher de uma
classe igualmente determinada. Se convencionarmos designar cada classe
por um indice (letra, número ou combinação de ambas), haverá, por·
tanto, tantos tipos de casamento permitidos quantos pares de indices,
com a condição de excluir previamente todos os que correspondem a
alianças proibidas.
No caso das estruturas elementares, a operação é consideravelmente
simplificada pelo fato de existir uma regra positiva que enumera ou
permite deduzir os tipos. Com os sistemas Crow-Omaha as coisas com·
plicam-se duplamente. Em primeiro lugar, o número das classes (se, por
conveniência, decidirmos designar assim as unidades exógamas) eleva-se
de maneira apreciável, pOdendo às vezes chegar a várias dezenas. Sobre-
tudo, o sistema não prescreve (ou s6 prescreve rara e parcialmente),
mas proíbe dois ou três tipos e autoriza todos os outros, sem nada nos
Informar quanto à sua forma e número.
É possível, entretanto, pedir aos matemáticos que traduzam, por
assim dizer, os sistemas Crow·Omaha em termos de estruturas elementa·
res. Convencionaríamos representar cada indivíduo por um vetor contando
tantos indices quantas as relações pelas quais o indivíduo pertença a
clãs, e que se tornam pertinentes devido às proibições do sistema. To-
dos os pares de vetores que não apresentam duas vezes o mesmo índice
constituirão então a lista dos tipos de casamento permitido, os quais de-
terminarão os tipos que se tornarão lícitos ou ilícitos para as crianças
nascidas das uniões precedentes e para seus próprios filhos. Bernard
Jaulin, chefe do Centro de Cálculo da Casa das Ciências do Homem, teve
a amabilidade de tratar do problema, pelo que muito lhe agradeço. Com
a ressalva das incertezas exclusivamente atribuíveis à maneira vaga e ca-
nhestra como um etnólogo apresenta seus dados, veriflca·se que um sis-
tema Crow-Omaha que promulgasse somente duas proibições, atingindo
o clã da mãe e o do pai, autorizaria com isso 23.436 tipos de casamento
diferentes, se o número dos clãs é igual a sete; 3.766.140 tipos se este
número é igual a quinze; e 297.423.855 tipos se é igual a trinta. Com
três proibições clânicas as coações seriam mais fortes, mas o número
dos tipos permaneceria na mesma ordem de grandeza, 20.181, 3.516.345 e
287.521.515, respectivamente.'
Estes números elevados dão motivo a várias reflexões. Primeiramente,
é claro que com os sistemas Crow-Ohama estamos diante de mecanis·
mos muito diferentes dos que Ilustram as sociedades de classes matri-



  1. Esta última série de números foi também calculada. por J. P. Schellhorn, a
    quem igualmente agradeço.


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