Claude Lévi-Strauss - As estruturas elementares do parentesco (1982, Editora Vozes) - libgen.lc

(Flamarion) #1

b


gerações abaixo daquela a que pertence o indivíduo, e agrupam os pa-
rentes clânicos e os nâo-clânicos, de acordo com a subdivisão da classe
em ahuta dalen (gente de meu clã) e mini dalen (gente de meu clã e de
outros).
A esta divisão do grupo familiar em sete andares horizontais cor-
respondentes às gerações correlaciona-se, ao menos teoricamente, uma
divisão em sete colunas verticais, representando os descendentes dos
irmãos e irmãs dos parentes, de meus irmãos e irmãs e de mim mesmo.
Não se trata exatamente de linhagens, porque teremos ocasião de mos-
trar que os termos que exprimem esta divisão viajam, se assim se pode
dizer, de uma linhagem para outra, e somente permitem definir o que
chamaríamos de bom grado uma "série linear". Temos, portanto, dois
lotes de termos, indicativos de geração e indicativos de série linear."
Este sistema, à primeira vista obscuro, fica esclarecido quando o
aproximamos da organização social dos turco-mongóis do Oeste, que pa-
rece ter sido melhor descrita. Os Kazak, com efeito, possuem dupla
organização em linhagens verticais e classes de gerações (hOrizontais),
que parece muito próxima do sistema Mandchu. Assim, o lendário fun·
dador da Grande Horda teria tido dois filhos, Taraq e Abaq, cada qual
fundador de um uru que tem o seu nome, e que agrupa todos os seus
descendentes patrilineares. Estes dois uru formam, ao mesmo tempo, diz
Hudson, .um nível genealógico de primeiro grau, A."' O progresso repete-se
na geraç'ão seguinte. Cada um dos quatro filhos de Abaq fundam por
sua vez .um UTU, constituindo o mesmo número de linhagens. cujo con-
junto forma um segundo nível genealógico, B. Na geração seguinte en-
contram-se trinta e dois uru formando um nível genealógico C, e assim
por diante.
O ponto importante consiste em que os uru dos níveis superiores
não desaparecem ao produzirem os dos níveis inferiores, mas subsistem
como unidades autônomas. Genealogicamente, um uru do nível C, por
exemplo, é formado pela descendência de um uru do nível B, o qual
resulta da subdivisão de um uru do nível A. Seria pois possível supor
que os uru A não existem mais no nível seguinte, a não ser em forma
dos uru B, aos quais deram nascimento,. e assim por diante. Ora, nada
disso acontece. Os "uru pais" sobrevivem indefinidamente ao lado dos
"uru filhos".
Cada uru é portanto definido simultaneamente como linhagem au·
tônoma e como emanação de certa classe de geração. O fato do uru ser
assim considerado, equivalente quase exato do dalan Mandchu, ressalta
desta observação de HUdson, paralela à de Shirokogoroff, que acaba de
ser citada. "Quando se encontra alguém, a primeira pergunta é sempre
4'Qual é teu uru?", e em resposta dá·se o nome da última e da mais res-
trita dessas subdivisões que se supõe ser conhecida pelo interlocutor". "8


  1. Para toda esta discussão, e a representação diagramática do sistema mandchu,
    o leitor poderá dirigir-se à primeira parte deste trabalho (cap. XIII), onde traçamos
    um paralelo entre o sistema manchu e o sistema dieri.

  2. Hudson, Kazak Social Structure, op. cit., p. 20.

  3. Ibid., p. 22.


425

Free download pdf