Claude Lévi-Strauss - As estruturas elementares do parentesco (1982, Editora Vozes) - libgen.lc

(Flamarion) #1

os lugares. "Este ponto... é muito mais importante para compreender
a etnologia do sul da lndia do que o casamento dos primos cruzados"."
É preciso, contudo, ir até Malabar para encontrar instituições matrilinea-
res caracterizadas. Isso não indica que a hipótese de Rivers sobre a origem
Malabar dos Toda seja justificada. "O aspecto geral da sociedade do sul
da lndia, tal como foi esboçado acima, oferece base satisfatória para
explicar o desenvolvimento peculiar aos Toda". Este aspecto geral con-
siste na predominância dos clãs patrilineares, com o desenvolvimento, lo-
calmente sistematizado, dos clãs matrilineares.
Uma interpretação semelhante foi proposta por Aiyappan para o casa-
mento entre primos cruzados nas populações Nayar matrilinear. Mas a
relação entre os dois modos de filiação deve ser invertida. "O casamento
dos primos cruzados é, entre eles, resultado de uma modificação incons-
ciente na direção das condições patrilineares". 1 A mesma situação en-
contra-se entre os Coorg, onde o casamento entre primos cruzados aparece
como resultado da intersecção de clãs patrilineares exogâmicos (oka)
por um sistema matrilinear de extensão limitada.' Seria fácil citar outros
exemplos.
Não se trata pois de negar a coexistência de dois modos de filiação
em certas regiões da lndia, onde é incontestável. Mas, como Held pôde
dizer que, nesse sistema "o casamento no clã (matrilinear) da mãe é
proibido, embora sendo autorizado no clã (patrilinear) da mãe", a pre-
texto de que ,"em tal sistema cada individuo pertence a dois clãs, o clã
patrilinear do pai e o clã matrilinear da mãe"?' Seria esquecer' que, se
o clã patrilihear da mãe permanece autorizado, o clã matrilinear da irmã
do pai não'; O' é menos, ou seja, a filha da irmã do pai continua sendo
um cônjuge: possível nas mesmas condições que a filha do irmão da mãe.
:E: perfeitamente claro que os Toda praticam o casamento entre primos
cruzados bilaterais. 1" O mesmo acontece entre os Coorg." Para que um
sistema com oito classes possa aparecer, autorizando o casamento com
a prima cruzada matrilaterai e proibindo-o com a prima cruzada patri-
lateral, é preciso, com efeito (a menos que surja do nada), que suceda
a um sistema de quatro classes, já fundado na troca generalizada, isto
é, autorizando e proibindo exatamente os mesmos tipos de casamento. A
subdivisão em oito classes não muda nada, não acrescenta nada. Conforme
mostramos ao discutir a obra de Granet, representa uma hipótese gratuita
e supérflua.
Granet, entretanto, tinha sido obrigado a recorrer a esta hipótese por-
que postulara a existência anterior, na China, de um sistema com quatro
classes (fundado na troca restrita>. Held seguiu a mesma orientação,
" mas por diferente razão. Algumas tribos da lndia central, tais como os
Bhil, os Maratha e os Kunbi, proibiriam, segundO Russel, o casamento no
clã da mãe, ao mesmo tempo que o recomendavam com a filha do irmão da
mãe." Held partiu, portanto, à procura de um sistema que correspon-



  1. Ibid., p. 174, n. 26.

  2. A. 4iyappan, Cross-cousin and Uncle-niece Marriages in South-India. Congres In-
    ternational des Sciences Anthropologiques ot Ethnograliques, Londres 1934
    8
    Emeneau, Kinship and Marriage amang the Coorgs. Journal 01 the Royal Asiatic
    Society 01 Bengal, Letters, vaI. 4, 1938, p. 126-127.

  3. Held, p. 53-54.

  4. Rivers~ op. cito Emeneau, 1937.

  5. Emeneau, 1938, p_ 127.

  6. Held, p. 52-53.


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