CARLOS FERNANDO
A república da mentira
11.12.20
.... 0 : 00 / 6:26
VELOCIDADO ÁUDDE IO 1.25x 1.SOx
SALVAR
A Constituição Federal foi a gr ande vencedora no recente julgamento do
Supremo Tribunal Federal sobre a possibilidade de reeleição dos presidentes do
Senado e da Câmara dos Deputados na mesma legislatura. Entretanto, mais que
a alegria de ter prevalecido o que j á estava previsto no artigo 57, o significativo e
pr eocupante foi o p lacar apertado em r elação à interpretação - se é que cabe
alguma interpretação além do reconhecimento da literalidade do seu comando -
ao texto clar o e inequívoco proibindo "a recondução para o mesmo cargo na
eleição imediatamente subsequente".
Essa divergência no plenário do STF só confirma o que temos fa lado há muito
tempo. Alguns ministros do Supremo agem movidos por interessas obscuros (ou
não tão obscuros assim), criando interpretações que são condizentes com sua
vontade e não com a da Constituição Federal. Ou seja, primeiro decidem quais
inter esses desejam atender e depois criam o "juridiquês" para enfeitar a decisão.
Basta ver a lista daqueles que resolveram atr opelar o texto de lei e tornar
possível o sonho de Rodrigo Maia de se tornar o primeiro-ministro de fato, para
entender toda a jurisprudência recente do STF. Temos um eixo de ministros
(Toffoli, Gilmar e Lewandowski) que representa os interesses da classe política e
do atual sistema de manutenção do poder pelo abuso sistemático do poder
econômico. Esse núcleo comandou não somente a recente tentativa de burla à
Constituição, como ainda, pelo mesmo motivo, vem destruindo as investigações
e condenações da operação Lava Jato.
Por sua vez, o escolhido pelo atual presidente, Kássio Nunes Marques, que se
alinha quase automaticamente com esse "eixo", divergiu apenas para fazer valer
a vontade de seu padrinho Jair Bolsonaro. Assim, votou contra Maia para
beneficiar Arthur Lira, líder do Centrão e envolvido em escândalos de corrupção,
mas torturou a Constituição Federal para satisfazer a ambição de Alcolumbre,
apoiador do presidente.
Em sentid o contr ári o da subordinação da ordem jurídica aos interesses políticos,
encontram-se os ministros Fachin, Barroso, Rosa Weber, Cármen Lúcia e Fux.
Esses ministros ali am-se em defesa da Constituição e da subordinação da
atividade política a ela. Como ministros pendulares (swing votes), há os ministros
Marco Aurélio, conhecid o por ser imponderável, e o calouro Alexandre de Mores,
que embarcou em mais uma canoa furada ao apoiar Gilmar Mendes nessa
tentativa de agradar ao grupo de Rodrigo Maia.
Aliás, Alexandre de Moraes já embarcou em sua curta carreira como membro do
STF em outras aventuras contra a Constituição, como a de censurar a r evista
Crusoé apenas para satisfazer Dias Toffoli. Tudo isso mostra que vivemos no
Supremo Tribunal Federal um equilíbrio de forças muito delicado e que a
qualquer momento há ri sco de novas interpretações que transformem proibido
em permitido, ou vice-versa, apenas para satisfazer poderosos. E é nisso, mais do
que em grupelhos de autoritários fascistoides, que se encontra o risco para
nossa democracia.