marighella

(Ornilo Alves da Costa Jr) #1
230 CARLOS, A FACE OCULTA DE MARIGHELLA

Além dessa, lembro ainda que Mariga era um folião e tanto. Em
1946 ou 1947, com o Partido na legalidade, ele era o organizador do
“bloco” dos comunistas no carnaval. Era o bloco da Mula Manca, com
direito a estandarte e tudo, no qual saí pela primeira vez fantasiado
de pirata da perna de pau. A concentração era na Glória, na frente
da sede do Partido. Muitos se fantasiavam.
Pelo que me lembro a mula era motivo de uma marchinha. O
único verso que ficou na minha memória foi: “Não importa que a
mula manque, o que eu quero é rosetar”. Coisas de baiano. Outro
baiano, aliás, Célio Guedes, primo a quem eu considerava tio, também
do Partido, amigo do Mariga, traduzia rindo esta frase da seguinte
forma: “Não obsta que o onagro claudique, o que anelo é acicatar”.
Português castiço, que me custou horas para decorar e, embora eu
não visse qualquer sentido nas palavras, achava muito engraçadas.


Edson – A figura da mula não era, então, só para aplicar injeção?
Marcos – Acho que a mula manca tinha um significado para eles,
pois adoravam a ideia da mula. Talvez lhes lembrasse, por analogia,
suas dificuldades e revezes na luta por um mundo melhor. Era uma
forma de rir dessas mesmas dificuldades, de enfrentá-las com bom
humor e alegria. Quem sabe?


Edson – E a participação dele no bloco?
Marcos – Era o principal responsável, o folião por excelência, o
animador de todas as brincadeiras. Incansável, organizava, convocava
companheiros, fazia paródias. Transformava as letras de marchinha e
samba em letras “revolucionárias” ou de “protesto”.


Edson – Quem participava desse bloco?
Marcos – Membros do Partido e seus familiares, com o eterno
cuidado de evitar “provocadores infiltrados”, que podiam causar
confusões para justificar prisões e perseguições policialescas.

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