24
Licenciado em engenharia
informática e mestrado
em computação móvel.
É programador de Java
na Void, e tem trabalho
na área da Internet das
Coisas e do código aberto.
os médicos marcados na cara e etc.. E depois reuni 22 modelos
que se encontravam na Net. Imprimi-os e experimentei-os.
Agarrei estas coisas boas da comunidade, comecei algo de
raiz, e mandei para o nosso grupo para pôr o projeto a mexer.
E qual foi a reação?
Na primeira noite, chegámos à versão 5! A malta começou a
produção a nível nacional e passou-a para os hospitais, e os
profissionais dos hospitais foram fazendo correções. Fomos
reduzindo as hastes e tornámos as viseiras mais ergonómi-
cas e chegámos a uma solução bastante flexível. Reduzimos
componentes para poupar (no material usado na impressão
3D). Há muitas soluções na Net que são confortáveis, mas têm
partes que são desnecessárias e que chegam a demorar três
horas a imprimir. O nosso modelo demora entre 49 minutos
e uma hora.
Que nome deram à vossa viseira?
F**k Covid.
Talvez não fosse mau apostarem mais no marketing...
Não queremos saber do marketing. Isto tem é de ser útil para
as pessoas que precisam!
...E ninguém se aproveitou do projeto para fazer negócio?
Não pegaram diretamente no nosso projeto; toda a informação
está na Net, com um licenciamento artístico e não comercial,
que pode ser modificado, mas não pode ser comercializado...
Apelei há poucos dias à indústria dos moldes, que temos aqui
na região (de Leiria e Marinha Grande), porque havia pessoas
desesperadas com as impressoras 3D a tentar dar resposta a
todos os pedidos. Tivemos mais de 30 pedidos de viseiras...
mesmo que cada uma demore uma hora a imprimir, estamos
a falar de muito tempo de impressão.
Quem é que são os destinatários?
Hospitais, lares, supermercados, funerárias, e principalmente
lares. Queria criar soluções, e lembrei-me de apelar à indústria
dos moldes. E fui muito bem recebido. Em dois dias, tínhamos
um molde que permite tirar mais de 20 mil peças, sem pro-
blemas. O desenvolvimento do molde contou com a ajuda da
Senhor Molde, da 3D Tav, e pessoas da Plastidom. Começou
numa segunda-feira e na sexta-feira estávamos a produzir
peças... Não considero que tenha havido um aproveitamento
nesta área.
E depois das viseiras, o que se segue?
Há necessidade de válvulas para pacientes entubados com
ventiladores. Nem toda a gente tem impressoras adequadas.
Vamos ver como resolvemos esse projeto. Estão aparecer
necessidades... clipes para os tubos do soro, e outros consu-
míveis. Toda a gente dos moldes diz que se faz um molde e
num instante se produzem 100 mil ou 200 mil dessas peças.
Mas há coisas que não consigo perceber e que talvez tenham
a ver com a política.
Também é possível fazer o raciocínio inverso: os makers
tiraram negócio à indústria?
Não podemos estar a concorrer com a indústria quando fomos
nós que a pusemos a mexer. Não podemos estar duas sema-
nas a doar peças porque é incomportável. Quisemos dar esta
primeira resposta ao pânico das pessoas que não têm viseiras
de proteção e, a partir daí, deixamos a indústria continuar o
trabalho.
O que não vos impediu de pensar em clipes, válvulas, ou
até ventiladores...
Nos ventiladores, iniciámos um projeto, mas é algo que não
podemos aplicar diretamente. Um ventilador separa a vida da
morte. Não é uma viseira na cabeça, que não pode fazer mal
a ninguém. Não é algo que se possa pôr num instante num
paciente, depois de falar com um médico para experimentar. E
depois vemos que alguém morreu e que não funciona. Têm de
ser outras entidades com outro tipos de políticas de certificação
que possam dar informação sobre o funcionamento. (Noutros
dispositivos) Têm sido divulgados requisitos necessários para
incentivar a indústria... mas nos ventiladores ainda há segredos
que os fabricantes não deixam passar cá para fora.
Todos os investimentos foram feitos sem procurar retorno?
Sim. O molde foi desenhado gratuitamente. A Plastidon, que
fornece o ABS (para as viseiras), criou uma linha de montagem
com cinco elementos que se voluntariaram para trabalhar
durante 24 horas em todos os dias de uma semana. Nas vi-
seiras, entrámos em força e sentimos interesses políticos. Há
municípios que entram em contacto connosco que querem
3000 ou 4000 viseiras. Mas não nos podemos dar ao luxo de
criar um stock com 3000 peças para alguém.
Nesses casos, é a indústria que deve atuar?
É o que dizemos. O molde é limitado e vai produzir o máximo de
peças que conseguirmos. Mas vamos doar todas; não importa
se é dentista, ou de um supermercado.
Como é que o Movimento Maker vai evoluir?
O Movimento Maker não é uma anarquia, mas não tem líderes.
Temos apenas a regra que impede que haja quem esteja no grupo
a vender coisas. Como não há centralização e cada maker tem de
se sentir realizado pelo que faz, tudo isto resultou muito bem a
nível nacional porque cada um produzia viseiras e entregava-as
a quem precisava. Todos puderam ser vistos nas suas freguesias
como altruístas, e não como representantes de uma entidade
ou do Bruno Horta. Não gostamos de chico-espertos que dizem
que está tudo mal e não apresentam soluções. Se alguém diz
que está mal, tem de dar uma solução. Se simplesmente está
a mandar umas bocas porque correu mal o dia ou tem a mania
que é doutor, e começa logo a mandar caneladas a quem está
a tentar aprender – é algo que não queremos, porque sabemos
que ninguém nasceu ensinado.
BRUNO HORTA