Cruzamento genético é um dado, não é questão de gosto, nem de
opinião. Quanto ao mito do povo pacífico, isso não resiste ao menor
exame histórico. Basta considerar as guerras do século XVI, o assassinato
do jornalista Vladimir Herzog, em 1975, os levantes de escravos e o
cangaço. Repare ainda que o retrato que a alta cultura faz do Brasil é
violentíssimo. Basta ler Os Sertões, de Euclydes da Cunha. Em Grande
Sertão: Veredas, Guimarães Rosa escreveu: “Quando Deus vier, que venha
armado”. O cinema brasileiro vai na mesma linha. Deus e o Diabo na Terra
do Sol, de Glauber Rocha, e Cidade de Deus falam de muito sangue. E a
Tropicália expõe um país onde “uma criança sorridente, feia e morta
estende a mão”. Melhor olhar o Brasil a partir do modo como aqui se
processam as dialéticas da violência e da conciliação.
Quais grupos hoje estão emplacando melhor sua visão de história e
identidade nacional?
A partir da década de 1970, a esquerda tratou de se contrapor ao discurso
da velha história oficial do Brasil, que ainda era o do Instituto Histórico e
Geográfico de Francisco Adolfo de Varnhagen (1816-1878), nos tempos de
D. Pedro II. Mas a esquerda escolheu o pior caminho. Em vez de repensar
em profundidade a experiência nacional brasileira, limitou-se a inverter os
sinais da velha história. O que antes era celebrado passou a ser execrado,
e vice-versa. No governo de Fernando Henrique Cardoso, com o ministro
da Educação Paulo Renato Souza, essa versão historiográfica de esquerda
foi oficializada nos parâmetros curriculares do ensino. A nova história
oficial do Brasil passou a ser a história da “era das desculpas”. O planeta
foi dividido em anjos e demônios, como nos filmes de mocinho e bandido,
em que todos são orientados a tomar abertamente o partido das vítimas.
O problema é que isso é feito a partir de fraudes e distorções dos fatos. O
mundo passou a ser visto como algo imutável, em que as pessoas são
eternamente prisioneiras da anatomia ou da cor da sua pele.
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