FERNANDO SCHÜLLER - A REPÚBLICA DA CLIENTELA
Banco Central do Brasil
Revista Veja/Nacional - Colunistas
sexta-feira, 12 de novembro de 2021
Banco Central - Perfil 1 - Banco Central
Clique aqui para abrir a imagem
Clique aqui para abrir a imagem
Clique aqui para abrir a imagem
Autor: FERNANDO SCHÜLLER
O deputado Augustinho negocia uma emenda de 3
milhões de reais para São Miguel do Ribeirinho, perto
de São Jorge do Jetiqui, e vota com o governo. O
projeto em si não faz lá muita diferença. Pode ser essa
PEC dos Precatórios, mas podia ser outro. O que será
feito com o dinheiro também não é o tema central. Pode
ser para comprar tratores ou por um asfalto novo na
cidade. O ponto é ajudar o prefeito a fazer mais votos
na próxima eleição; o prefeito dar uma força para o
deputado na reeleição, e este para o governo, lá em
Brasília.
A política, no Brasil, tem um lado de clientela. Sua face
recente foi o chamado “orçamento secreto”. As
“emendas de relator”, as RP9, na linguagem do
Orçamento. Seu valor vai a 17 bilhões de reais neste
ano, mas o STF, seguindo o voto da ministra Rosa
Weber, suspendeu sua execução. A ministra diz causar
perplexidade que “parcela significativa do Orçamento
esteja sendo ofertada aos parlamentares” para que eles
usem os recursos “conforme interesses pessoais”. A
ministra Cármen Lúcia falou em um sistema de
“cooptação política”, com potencial para “pôr em risco” a
própria democracia. Talvez seja um exagero. A
democracia pode ir se arrastando. Ela é “inclusiva” das
elites políticas, como dizem os acadêmicos. O que vai
sangrando é o “princípio da eficiência”, que deveria
reger o uso do dinheiro do cidadão.
0 sistema de clientela produz uma penca de problemas.
O primeiro é a pulverização de recursos a partir da
decisão política de cada parlamentar. Há quem diga que
é melhor fazer assim do que deixar a decisão nas mãos
do governo. Dado que somos um país continental,
parece lógico que os deputados saibam mais sobre
cada região do que os burocratas em Brasília. O
argumento é sedutor, mas será verdade? Para que
serviria, então, a estrutura técnica do governo? As
centenas de gestores federais, bem pagos, com seu
arsenal de dados e indicadores? E para que serviriam
prefeitos, secretários e governadores? Mesmo com toda
essa parafernália, o melhor que temos para distribuir o