— Você ainda o vê?
— De vez em quando. — Ela ficou parada de frente para o fogão. — Mais
café?
Jodie sentiu a vida solitária pairar na cozinha. Estava presente no estoque
minúsculo de cebolas no cesto de legumes, no único prato secando no escorredor,
no bolo de milho enrolado cuidadosamente num pano de prato, como uma velha
viúva faria.
— Já bebi bastante, obrigado. Mas que tal um passeio de barco pelo brejo? —
sugeriu ele.
— Claro. Você não vai acreditar, estou com um motor novo, mas ainda uso o
mesmo barco de antigamente.
O sol tinha feito as nuvens se abrirem e brilhava forte e quente para um dia de
inverno. À medida que Kya os guiava por canais estreitos e estuários espelhados,
Jodie se espantou com a mesma árvore morta de antes e com um abrigo de castor
ainda erguido exatamente no mesmo lugar. Eles riram ao chegar à lagoa onde Ma,
Kya e as irmãs tinham atolado o barco na lama.
De volta ao barracão, ela organizou um piquenique, que eles foram comer na
praia com as gaivotas.
— Eu era muito nova quando todos foram embora — disse ela. — Me fale
sobre todo mundo.
Jodie então lhe contou histórias sobre o irmão mais velho, Murph, que
costumava colocá-la nos ombros e carregá-la pela mata.
— Você não parava de rir. Ele corria e ficava rodando com você lá em cima. E
uma vez você riu tanto que molhou a calça bem no pescoço dele.
— Ai, não! Eu não fiz isso.
Kya se recostou para trás, rindo.
— Fez, sim. Ele resmungou um tanto, mas seguiu em frente e correu direto
para a lagoa até ficar submerso, com você ainda nos ombros. Estava todo mundo
assistindo, Ma, Missy, Mandy e eu, e choramos de tanto rir. Ma precisou se sentar
no chão de tanto que ria.
A mente de Kya foi inventando imagens para acompanhar as histórias.
Recortes e fiapos de família que ela jamais pensara ter.
— Foi Missy quem começou a dar comida para as gaivotas — continuou
Jodie.
— O quê? Sério? Pensei que eu tivesse começado sozinha, depois que todo
mundo foi embora.
— Não, ela dava comida para as gaivotas sempre que podia. Deu nome a todas
elas. Chamava uma de Vermelho Grande, disso eu me lembro, por causa da
mancha vermelha no bico, sabe?
— Não é o mesmo pássaro, claro... Eu já acompanhei algumas gerações de
Vermelhos Grandes. Mas lá, ali à esquerda, é o Vermelho Grande de agora.
Ela tentou se conectar com a irmã que havia lhe dado as gaivotas, mas tudo
que conseguiu ver foi o rosto do quadro. O que era mais do que tinha antes.
Kya sabia que a mancha vermelha no bico de uma gaivota era mais do que
decoração. Somente quando os filhotes batiam os bicos nesse ponto o pai ou a
carla scalaejcves
(Carla ScalaEjcveS)
#1