DALAILAMA 107
Apesar do sofrimento acumulado por observar
à distância tudo o que vai acontecendo no Tibete,
o líder espiritual tem recusado constantemente o
encorajamento da violência. Quando lhe pergun-
tam como é possível não reagir com ira e amar-
gura, ele explica que os monges tibetanos são
“formados de acordo com a tradição Nalanda e...
tornamo-nos mais realistas... Todos os seres hu-
manos [são] nossos irmãos e irmãs”.
Enquanto deambulava pelo mundo em busca
de uma solução diplomática, o Dalai Lama dirigiu
apelos à ONU. Em 1987, apresentou um plano de
paz em Washington e, em 1988, dirigiu-se ao Parla-
mento Europeu. Teve reuniões com vários líderes
mundiais, entre os quais presidentes e membros
do Congresso dos EUA e o papa João Paulo II, em
prol do povo tibetano. Em 2001, visitou Portugal,
proferindo uma conferência na cidade do Porto.
Numa das suas propostas à China, apresentou a
“Via Intermédia”, renunciando ao sonho da inde-
pendência do Tibete em troca de uma autonomia
mutuamente benéfica que preservasse a cultura
tibetana. Recebeu o Prémio Nobel da Paz em 1989,
mas não tem conseguido proteger o Tibete.
Quando lhe pergunto se a abordagem da Via
Intermédia foi um erro, o Dalai Lama responde
que ainda acha que pode resultar. Na sua opi-
nião, o actual presidente da China, Xi Jinping,
demonstrou coragem ao lidar com a corrupção
no seu país e está a optar “por uma nova manei-
ra de pensar [após] 70 anos [de] política de linha
dura... Vamos ver: mais um ano, dois anos, acho
que algo poderá mudar”.
PASSADOS TODOS ESTES ANOS, o Dalai Lama
ainda sente saudades do mundo que deixou para
trás, embora acredite que as antigas tradições
budistas do Tibete não teriam sobrevivido se ele
não tivesse partido.
Tem desenvolvido esforços para espalhar a sa-
bedoria dessas tradições em todo o mundo, parti-
lhando conhecimentos sobre a maneira de os se-
res humanos procurarem a felicidade e reduzirem
o sofrimento. Refere-se frequentemente às liga-
ções entre o budismo e a ciência moderna, citan-
do trabalhos das duas disciplinas e demonstrando
que a compaixão é benéfica para o nosso cérebro.
Actualmente, o espírito tibetano “não está a mor-
rer”, diz. “Espírito tibetano muito forte.” E, afirma,
embora “tenha perdido uma casa pequena,” ele
“encontrou uma casa grande.”
“Que casa?”, perguntei.
Ele respondeu: “Todo o mundo.”
Esse mundo talvez o veja menos no futuro.
O seu corpo já não o deixa manter o mesmo rit-
mo. “Tenho cada vez mais a sensação de cansa-
ço. É perfeitamente compreensível, por causa da
idade”, diz. Vai voar menos vezes, pois reconhe-
ce que “é muito longe e... agora muito difícil”.
Os joelhos incomodam-no quando sobe ou des-
ce. No ano passado, as visitas à América do Nor-
te foram canceladas, mas viajou até à Europa.
O seu programa anunciado para 2019 mantê-lo-
-á mais próximo de casa, na Índia.
Há alguns anos, fez tratamentos para o cancro
da próstata e os médicos asseguram que goza de
boa saúde. Quem o veja e quem o ouve acha-o
muito mais novo do que é. Mesmo assim, os
seus colaboradores impõem-lhe limitações ao
programa de actividades diárias. As audiências
com dignitários e outras pessoas, que outrora
se prolongavam até às cinco da tarde, são agora
agendadas de modo a terminarem antes do al-
moço, embora ele tenda a trabalhar mais do que
os seus colaboradores desejariam. Em certos
dias, chega a haver uma fila com mil pessoas de
todo o mundo à espera de serem recebidas.