vezes, quase se pulveriza. É a mesma coisa com isso.
- Você poderia analisar os pedaços para mim? Ver se há algo que...
- Posso perguntar uma coisa? – ele disse, interrompendo-a.
Eva olhou para ele. No olhar de Hans Jørgen havia algo que não lhe agradava. - Por que você está fazendo isso? – ele quis saber.
- Porque alguma coisa não se encaixa.
- Mas por que logo você? Afinal, nem os conhece. Você não conhecia Christian
Brix. Para você, não é mais que um óbito suspeito. E esses existem de sobra.
A sensação de mal-estar aumentou. Eva não sabia o que dizer. - Como já contei, perdi meu noivo no Afeganistão. Perdi tudo. A casa, as
economias, o amor... tudo. - E agora você acha que luta para... Luta para quê? Para vingar seu noivo?
Eva deu de ombros. De repente, caiu em si e percebeu que estava dentro de um
barco. Não tinha terra firme debaixo dos pés. Tinha vontade de sair. Tinha
também vontade de dizer alguma coisa, de dar uma explicação. De dizer, por
exemplo, que não sentia que estava lutando contra os que tinham matado Martin.
Não contra os talibãs. Até porque eles não eram mais que guerreiros primitivos que
lutavam contra uma potência de ocupação, e isso era compreensível. Não, ela lutava
contra algo maior, um sistema. Contra os que tinham mandado Martin para lá. Era
contra esses que Eva lutava. Contra os que tinham enganado Martin para que ele
acreditasse que lutava por uma boa causa, por tudo o que eles representavam. A
retórica pomposa de que havia uma verdade superior às outras. De que ele estava do
lado certo. Deus, a monarquia, a pátria – isso tudo, ombro a ombro, atuando com
força prodigiosa na eterna busca da liberdade. Assim estava Martin quando voou
pelos ares. Assim estava ele, no meio do deserto, arrebentado até ficar
irreconhecível. Lá, junto com a Dinamarca oficial e com tudo o que se julgava
representante da segurança, da verdade, da igualdade. Eva teria gostado de dizer
isso, mas não disse nada, nem uma única palavra.