Bom ângulo, distância adequada, e Marcus poderia subir à claraboia da parede para
instalar a câmera. Alguém o veria? É, talvez. Alguém tomaria providências? Não.
Ninguém reclamava desse tipo de coisa, o que era sinal de saúde cívica. Pelo menos,
era o que parecia a Marcus. Só se podia considerar positivo que os cidadãos
confiassem nas autoridades, que confiassem em que as autoridades lhes prestavam a
proteção necessária. Por essa premissa, passávamos a aceitar certo grau de vigilância.
Porque sabíamos que era para nosso bem. Para nos proteger, para que os crimes
fossem solucionados, para que pudéssemos nos sentir seguros nas ruas. Por isso, a
visão de um homem bem-vestido, de cabelo à escovinha, trepado numa claraboia e
mexendo num dispositivo eletrônico numa ruela qualquer de Copenhague não
provocaria nem uma reclamação sequer. Por que as pessoas se preocupariam? Devia
ser o dono do bar, que queria vigiar a propriedade. Ou talvez um policial à paisana,
ajustando uma dentre os milhares de câmeras que estavam instaladas na cidade
toda.
- Muito obrigada de novo, meu chapa! – gritou da outra calçada a mulher, com
um cigarro na boca e uma cerveja de alto teor alcoólico na mão. A amiga riu e
acenou.
Marcus se limitou a responder ao aceno enquanto as via sumirem dentro do
Reden. Alguma coisa nos movimentos da mulher, os quadris, ou talvez só o cabelo,
lembrava Eva. E pensar que era por Eva que ele fazia o que estava fazendo! Para
salvá-la. Mas será que não fazia também por si mesmo, porque esperava poder
encontrar-se com ela – encontrar-se de verdade, conhecê-la? Ficou um instante
procurando respostas, mas não achou.
De um pulo, Marcus subiu à claraboia. Tratou de se desligar dos outros
pensamentos e concentrar-se na missão. As outras câmeras estavam numa sacola, e
logo as teria instalado também. Tirou o celular do bolso. Entrou no aplicativo que
o atendente lhe tinha indicado. Mal se passou um segundo e viu uma imagem na
tela. Vigilância. Houve época em que isso cabia ao Estado; agora estava ao alcance