A peneira de Aras
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Jornal Folha de S. Paulo/Nacional - Opinião
domingo, 24 de abril de 2022
Cenário Político-Econômico - Colunistas
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Augusto Aras, na condição de procurador-geral da
República, resolveu tapar o sol com a peneira.
Reprovado amiúde por inverter o sentido do cargo que
ocupa, fez o que lhe pareceu mais fácil: processou um
de seus críticos.
Trata-se de Conrado Húbner Mendes, professor de
direito constitucional da USP e colunista desta Folha. O
procurador geral quer vê-lo condenado por calúnia,
injúria e difamação devido a postagens em redes sociais
e uma coluna intitulada 'Aras é a antessala de
Bolsonaro no Tribunal Penal Internacional'.
Aras não gostou de ser chamado de 'Poste Geral da
República', de 'servo do presidente' e de grande fiador
da crise vivida no Brasil em decorrência da Covid,
expressões utilizadas por Mendes para caracterizar a
omissão do PGR diante dos desmandos de Jair
Bolsonaro (PL).
Na primeira instância do Judiciário, deu-se o mais
natural. A juíza federal Pollyanna Kelly Alves, lembrando
o valor inestimável que tem o direito de liberdade de
expressão dos pensamentos e ideias, entendeu não ter
havido ofensa à honra de Aras e rejeitou a queixa-crime.
A surpresa surgiu no Tribunal Regional Federal da 1º
Região, quando os juízes federais Marllon Sousa e
Maria do Carmo Cardoso votaram a favor do recurso de
Aras, vencendo a posição sustentada por Olívia Merlin
Silva e determinando que o processo volte a tramitar.
Ignoraram, comisso, decisões em que o Supremo
Tribunal Federal estabeleceu que, numa sociedade
democrática, não cabe a repressão penal ao
pensamento, sobretudo quando a crítica, por mais
severa? ácida que seja, venha inspirada pelo interesse
público.
Para o STF, a liberdade de imprensa abrange o direito
de informar, de buscar a informação, de opinar e de
criticar.
Não se confundam tais prerrogativas com um vale-tudo.
Criticar é uma coisa, ameaçar e coagir são outra.
Existem limites, mas eles não são cruzados quando os
comentários expressam opiniões negativas, ainda que
mordazes ou irônicas, a respeito de figura pública.
Autoridades públicas estão sujeitas a maior escrutínio
em sociedades democráticas, e não será com a
abertura de processos penais que esse pilar sairá
fortalecido.
Aras, ao ascender à PGR, deveria saber que atrairia
para si mais luzes do que nunca. Talvez seja impossível
passar pelo cargo sem sofrer críticas, mas elas
certamente são pouco numerosas e menos duras para
quem honra a função.
COLUNISTAS
Assuntos e Palavras-Chave: Cenário Político-
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