Vingança a Sangue-Frio

(Carla ScalaEjcveS) #1

descansar. O urso morreu passados quatro dias.


Raskol fechou os olhos e esboçou o seu sorriso triste.
– Nesse mesmo Outono, Stefan e eu fugimos. Menos duas bocas para
alimentar. Fomos para norte.


– Que idade tinham?
– Eu tinha oito e ele tinha doze. O plano era chegarmos à Alemanha
Ocidental. Nesse tempo, estavam a deixar entrar refugiados de todo o mundo
e a alimentá-los. Presumo que fosse o seu modo de compensação. Stefan
achava que quanto mais novos fôssemos, maiores as nossas hipóteses de
conseguirmos entrar. Mas fomos detidos na fronteira da Polónia. Fomos para
Varsóvia onde dormimos debaixo de uma ponte, cada um com um cobertor,
na zona cercada do Wschodnia, o terminal ferroviário oriental. Sabíamos que
conseguiríamos encontrar um schlepper , um contrabandista de pessoas.
Passados alguns dias encontrámos um homem que falava romeno, que dizia
ser um guia de fronteira e que nos prometeu levar até à Alemanha Ocidental.
Não tínhamos dinheiro para lhe pagar, mas ele disse que havia maneiras de o
fazermos. Conhecia alguns homens que pagavam bem por rapazinhos ciganos
bonitos. Eu não sabia de que é que ele estava a falar, mas era óbvio que Stefan
sabia. Levou o guia para um lado e discutiram em voz alta, enquanto o
homem apontava para mim. Stefan sacudiu a cabeça repetidas vezes e, por
fim, o guia levantou os braços ao ar e acabou por ceder. Stefan pediu-me para
esperar até que ele voltasse de carro. Fiz aquilo que ele disse, mas as horas
passaram. Era de noite, por isso deitei-me e adormeci. Durante as duas
primeiras noites debaixo da ponte, eu acordava com o guinchar dos travões
dos vagões de mercadorias, mas os meus jovens ouvidos aprenderam
rapidamente que não era em relação àqueles sons que tinha de me manter
vigilante. Por isso dormi e só acordei a meio da noite quando ouvi passos
furtivos. Era Stefan. Rastejou para debaixo do cobertor e encostou-se ao muro
molhado. Ouvi-o chorar, mas fechei os olhos com força e não me mexi.
Passados instantes, voltei a ouvir os comboios. – Raskol levantou a cabeça. –
Gosta de comboios, Spiuni?


Harry assentiu.
– O guia voltou no dia seguinte. Precisava de mais dinheiro. Stefan voltou a
partir no carro. Quatro dias depois, acordei ao início da madrugada e vi
Stefan. Devia ter estado acordado durante toda a noite. Estava deitado como
lhe era habitual com os olhos semicerrados, e consegui ver a respiração dele a
erguer-se no ar gelado da manhã. Tinha sangue na cabeça e um dos lábios

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