– Não aceito notas grandes – disse ele.
Harry encolheu os ombros.
– De qualquer maneira, vamos voltar, Muhammed.
No pequeno hotel chamado Vitória, como era estação baixa, cada um deles
ficou com um quarto grande. Deram a Harry a chave com o número 69,
apesar de o hotel ter apenas dois pisos e vinte e poucos quartos. Ao abrir a
gaveta da mesa-de-cabeceira, embutida numa cama vermelha com o formato
de um coração, encontrou dois preservativos com os cumprimentos do hotel e
presumiu que aquela era a suite nupcial. A porta da casa de banho estava
totalmente coberta por um espelho, visível por qualquer pessoa que se
encontrasse na cama. Num roupeiro desproporcionalmente grande e profundo,
a única peça de mobiliário no quarto para além da cama, pendiam dois
roupões curtos, usados e com símbolos orientais nas costas.
A recepcionista sorriu e sacudiu a cabeça quando lhe mostraram as
fotografias de Lev Grette. O mesmo aconteceu no restaurante vizinho e no
Internet Café, um pouco mais acima, numa rua principal estranhamente
silenciosa. De um modo tradicional, conduzia da igreja ao cemitério mas
recebera um novo nome: Broadway. Na minúscula mercearia com
SUPERMERCADO escrito por cima da porta, onde se vendia água e decorações
natalícias, acabaram por encontrar uma mulher atrás da caixa registadora. Ela
respondeu que «sim» a tudo o que lhe perguntaram, e observou-os com uma
expressão distraída até eles desistirem e saírem da loja. Ao voltarem ao hotel
viram um indivíduo sozinho, um jovem polícia encostado a um jipe, de braços
cruzados e um coldre protuberante a pender-lhe junto às ancas, que seguia os
movimentos deles a bocejar.
Na ahwa de Muhammed, o rapaz magro atrás do balcão explicou-lhes que o
patrão decidira de repente tirar uma folga e ir dar um passeio. Beate
perguntou-lhe quando é que ele voltaria, mas o rapaz não o sabia. Sacudiu a
cabeça, apontou para o Sol e disse:
– Trancoso.
A recepcionista do hotel disse que a caminhada de treze quilómetros ao
longo da ininterrupta faixa de areia até Trancoso era o maior ponto de
referência de d’Ajuda. Para além da igreja católica na praça, também era
única.
– Hm. Porque é que há tão poucas pessoas por aqui, minha senhora? –
perguntou Harry.