O coração acelerou-se-lhe enquanto torcia o puxador e o maldito parafuso
girou e girou com um rangido, mas recusou-se a sair. Ouviu a porta bater na
escadaria. Depois o parafuso soltou-se e Harry ergueu a tampa do depósito. O
raspar da porcelana contra porcelana ressoou na penumbra enquanto a água
continuava a subir. Harry enfiou a mão no interior e os dedos bateram contra
o revestimento escorregadio do tanque. Mas que raio? Nada? Virou a tampa e
ali estava. Colada ao interior. Respirou fundo. Cada reentrância, cada nó, cada
ponta denteada da chave sob a fita adesiva brilhante era uma velha amiga.
Servia na entrada principal do prédio de Harry, na cave, no seu apartamento.
A fotografia ao seu lado também lhe era familiar. A fotografia que
desaparecera do espelho. Sis estava a sorrir e Harry a tentar parecer duro. Um
bronzeado de Verão e uma ignorância abençoada. Contudo, Harry
desconhecia o pó branco no interior do saco plástico preso por três pedaços
largos de fita adesiva preta, mas estava pronto a apostar uma soma avultada
em como aquilo era diacetilmorfina, mais conhecida como heroína. Muita
heroína. No mínimo, o equivalente a seis anos sem condicional. Harry não
tocou em nada, apenas voltou a colocar a tampa do depósito no lugar e
aparafusou-a enquanto se mantinha atento ao som de passos. Como Beate
dissera, as provas não valeriam nada se se soubesse que Harry estivera no
apartamento sem um mandado. O puxador estava de novo na sua posição
original e ele correu para a porta. Não tinha outra opção senão abrir a porta e
sair para o patamar. Passos arrastados subiam as escadas. Fechou
silenciosamente a porta, espreitou por cima do corrimão e viu uma madeixa
de cabelo escuro e grosso. Dentro de cinco segundos, o homem iria aparecer.
Três passadas longas até ao quinto piso seriam o suficiente para manter Harry
oculto.
O homem parou de repente quando viu Harry sentado à sua frente.
– Olá, Alf – disse Harry, a olhar para o relógio. – Estava à tua espera.
O homem olhou para ele de olhos escancarados. Um rosto pálido e sardento
emoldurado por cabelo oleoso, à altura dos ombros, com um corte à Liam
Gallagher à volta das orelhas. Não fazia Harry pensar num assassino
endurecido, mas num jovem com medo de voltar a ser espancado.
– O que é que quer? – perguntou o homem numa voz alta e aguda.
– Quero que venhas comigo até ao Quartel-general da Polícia.
O homem reagiu instintivamente. Virou-se, agarrou-se ao corrimão e saltou
para o patamar inferior.
– Ei! – gritou Harry, mas o homem já desaparecera. O embater pesado dos