cemitério sozinho e passou pelo mar de lápides, até chegar ao túmulo de
Daniel Allon, nascido no dia 27 de setembro de 1988, morto no dia 13 de
janeiro de 1991, numa noite de neve no Primeiro Distrito de Viena, num
Mercedes azul destruído por uma bomba. O artefato fora plantado por um
líder terrorista palestino chamado Tariq al-Hourani, sob ordens diretas de
Yasser Arafat. Gabriel não era o alvo; aquilo seria leniente demais. Tariq e
Arafat queriam puni-lo forçando-o a assistir à morte de sua mulher e filho,
para que pudesse passar o resto da vida de luto, assim como os palestinos.
Apenas um elemento da trama falhara: Leah sobrevivera ao inferno. Agora
ela vivia num hospital psiquiátrico no topo do monte Herzl, prisioneira da
própria memória e de um corpo destruído pelo fogo. Tomada por uma
combinação de estresse pós-traumático e depressão psicótica, revivia
constantemente o atentado. De vez em quando, tinha lampejos de lucidez.
Durante um desses períodos, ela concedera a Gabriel permissão para se casar
com Chiara. Olhe para mim, Gabriel. Não resta nada de mim. Nada além de
uma memória.
Gabriel consultou o relógio de novo. Não olhando a data, mas a hora.
Havia tempo para uma última despedida. Uma última torrente de lágrimas.
Um último pedido de desculpas por ter deixado de vasculhar o carro antes
de Leah dar partida. Em seguida, ele se afastou cambaleante do jardim de
pedra, no dia que já fora o seu favorito do ano, e subiu na traseira de um
sedã do Escritório que era conduzido por um garoto de 25 anos.
Lior teve o bom senso de não falar uma palavra sequer durante o
caminho até o aeroporto. Gabriel entrou no terminal como um viajante
qualquer, mas então foi a uma sala reservada para a equipe do Escritório,
onde esperou seu voo ser chamado. Ao se acomodar no assento de primeira
classe, sentiu um impulso não profissional de ligar para Chiara. Usando
técnicas que lhe foram ensinadas na juventude por Shamron, ele a afastou
de seus pensamentos. Agora não havia Chiara. Nem Daniel. Nem Leah.
Havia apenas Madeline Hart, a amante sequestrada do primeiro-ministro
britânico Jonathan Lancaster. Enquanto o avião decolava em direção ao céu
que começava a escurecer, ela apareceu para Gabriel num retrato a óleo,
como Suzana banhando-se num jardim. Espiando-a de trás de um muro
estava um homem com um rosto anguloso e uma boca pequena e cruel. O
homem sem nome nem país. O homem esquecido.
carla scalaejcves
(Carla ScalaEjcveS)
#1