causa de questões marginais.
Piscou os olhos para desfazer o efeito hipnótico que a vidrava nos reflexos
luminosos da baía, voltou a cabeça para o amigo.
— Olha, Patrício — disse. — Eu acho que há muita propaganda nessa treta
toda de que a FNLA vem aí para matar toda a gente e de que os tipos são uns
canibais e vão comer as criancinhas ao pequeno-almoço e sei lá mais o quê.
— Achas?
— Acho. Que os tipos são uns selvagens, já nós sabemos, agora, que vão
conseguir conquistar Luanda, não sabemos. Aquilo que sabemos de facto é
que a cidade está cheia de boatos e que as pessoas estão em pânico porque
ouvem os maiores disparates. Patrício, vamos ter calma e não entrar nessa
paranóia que não nos ajuda nada. — Patrício abanou a cabeça, a dizer que
não, a resistir à lógica dela.
— As notícias que eu ouço não são boatos. Benguela caiu ontem e nada vai
impedir os gajos de entrarem em Luanda.
— Sabes lá se entram.
— Ai não, que não sei.
— Porra, Patrício, pára lá com isso — exclamou Regina, irritada.
Ele calou-se, ela calou-se, ele fez um esgar, ela riu-se, ele foi atrás do riso
dela.
— Dá-me cá um cigarro — pediu Regina, à laia de cachimbo da paz.
Patrício chegou-se à frente e arrastou para junto dela o maço de tabaco e a
carteira de fósforos que estavam em cima da mesa. Regina acendeu um.
— Tens razão — acabou ele por admitir. — Não vale a pena entrar em
pânico.
Regina deitou fora o primeiro fumo do seu cigarro.
— Pois tenho. Olha, outra coisa, já falei com o Antero — disse, mudando
de assunto, aliviada por conseguir levá-lo para a conversa que realmente a
interessava.
— Foi?, e então?
— Então, ele mentiu-me.