Público • Quinta-feira, 19 de Setembro de 2019 • 5
COVERING CLIMATE NOW
M.H.: Quão mais fácil seria o seu
trabalho se a posição dos
Estados Unidos fosse diferente
da que é hoje?
Se todos estivessem empenhados
em reduzir 45% das emissões até
2030, eu estaria muito melhor. É
nossa função tentar convencer cada
vez mais pessoas de que isto tem de
ser feito, porque a natureza está
zangada. Não podemos brincar
com a natureza, porque ela devolve
o golpe. É isso que estamos a ver e
este é um problema muito sério. As
pessoas às vezes não falam de
outras áreas também. Por exemplo,
a saúde pública. Vemos a poluição e
as alterações climáticas a matarem
7 milhões de pessoas por ano no
mundo inteiro. E vemos doenças
tropicais a deslocarem-se para
Norte, tornando-se uma ameaça
para países desenvolvidos.
M.P.: À medida que o Norte
aquece.
E por isso não é só uma questão dos
glaciares que derreteram. São
questões que estão relacionadas
com as nossas vidas diárias.
Tempestades, secas (como no caso
do meu país) e doenças que
estavam completamente
esquecidas nos países
desenvolvidos em risco de
reaparecer. As pessoas têm de estar
mais conscientes disso. E isto será,
acredito, um forte instrumento
para levar os governos a agir. É a
vida das pessoas que está em
perigo. A última onda de calor na
Europa matou várias pessoas,
especialmente idosas.
M.P.: Ainda tem esperança de
convencer a administração
Trump sobre os erros que
comete em relação às alterações
climáticas e ao abandonar os
acordos internacionais?
A esperança é algo... que nunca
devemos perder.
M.P.: Tem ouvido outros países a
questionarem: “Se eles não o
farão, por que é que o faremos”?
Os países têm de perceber que não
podem esperar pelo vizinho. Têm
de agir por sua conta, porque o
“Não podemos brincar com a
natureza, ela devolve o golpe”
risco é um risco global. Ninguém
conseguirá escapar. Por isso, o meu
sentimento é que
independentemente do que um
país decida, os outros países
estarão cada vez mais
comprometidos com o Acordo de
Paris.
M.P.: Apesar dos acordos
celebrados em Paris para
diminuir a produção de gases
com efeito de estufa, não será
possível limitar o aumento da
temperatura aos desejados 1,5º
C. As emissões e as temperaturas
continuam a aumentar. Todas as
consequências, como as
tempestades, continuam a
acontecer e são mais frequentes.
O Acordo de Paris falhou?
Não. Há agora cada vez mais países
a tomarem medidas que reverterão
a tendência actual. Se reparar na
União Europeia, apenas três países
se opuseram à estratégia para
conseguir a neutralidade carbónica
em 2050. Acredito que até isso será
ultrapassado. Em países como a
China e a Índia, a energia solar está
a crescer, o que é assinalável.
Consegue-se sentir um novo vento
de esperança a soprar. Portanto,
acho que estamos a chegar ao topo
das emissões e vamos começar a
descer brevemente.
M.P.: Se é um vento de
esperança, é um vento quente.
Está na altura de encarar a
realidade de que estas metas não
serão alcançadas?
O que a ciência nos diz neste
momento é que estas metas ainda
podem ser alcançadas. É preciso
mudar a forma como produzimos
comida, impulsionamos as econo-
mias, organizamos as cidades e
geramos energia. Este é o tipo de
mudanças que são necessárias e
que cada vez mais pessoas, empre-
sas, cidades e governos percebem
que têm de executar.
sociedade a mexer-se bastante e
vejo cada vez mais pressão a ser
exercida sobre os governos.
Se observar a mais recente
sondagem nos EUA, verá que a
grande maioria das cidades
americanas considera agora as
alterações climáticas uma séria
ameaça e que o Governo tem de
agir. É por isso que estou
esperançoso. Precisamos de
continuar nesse caminho.
Precisamos de continuar a dizer a
verdade às pessoas e conÆar que o
sistema político, em especial os
sistemas democráticos, acabe por
decidir de acordo com a vontade
das populações.
Mark Hertsgaard é da revista
The Nation , Mark Phillips, da
CBS News
Vemos a poluição e
as alterações
climáticas a
matarem 7 milhões
de pessoas por ano
no mundo inteiro. E
vemos doenças
tropicais a
deslocarem-se para
Norte. [Vemos]
tempestades, secas
(como no caso do
meu país). É a vida
das pessoas que
está em perigo
Vejo a sociedade
cada vez mais
empenhada na
acção climática.
O que eu desejo é
que toda a
sociedade faça
pressão sobre os
governos, para que
percebam que têm
de acelerar
É necessário
explicar que o maior
custo é o custo de
não fazer nada
Esta entrevista integra o
projecto Covering Climate Now,
uma colaboração global de mais
de 250 organizações de media