matias

(Zelinux#) #1
REFLEXÕES SÔBRE A VAIDADE DOS HOMENS

me; o pensamento nesta parte é sempre favorável,
porque debaixo daquelas sombras nunca supõe outras
sombras, luzes sim: há coisas, que de se ocultarem,
resulta verem-se melhor; em vingança de um manto
escuro, tudo o que está debaixo dêle, se nos representa
perfeito e singular; aquela espécie de rebuço o de que
serve é de avivar a imaginação, de a desanimar, não:
tudo o que se esconde, parece-nos admirável, só
porque se esconde; de sorte, que o ocultar, é o meio de
acreditar as coisas, e de dar-lhes maior valor. O mesmo
é pôr-se aos olhos um obstáculo, que fazê-los
penetrantes, e pô-los em uma atividade, que êles não
têm naturalmente: a vista, que se embaraça, adquire
maior fôrça, à maneira de uma corda, cujo vigor
aumenta à proporção que a fazem fugir do arco; a
mesma distância em que algumas coisas se põem, as
fazem estar mais perto; e por êste princípio, tudo o que
se esconde, se mostra. Quem dissera, que o recato, e a
modéstia, mais chamam do que desviam, mais servem
de convidar, que de afastar! quem foge, parece que
quer que o sigam; quem deixa, parece que quer que o
busquem: o mesmo é cobrir o rosto, que incitar mil
vontades de o descobrir; a desconfiança faz nascer a
instância e o cuidado; o engano muitas vêzes se evita
só com não o presumir; e com efeito o retirar-se e pôr-
se em defesa, é o mesmo que dar um sinal de guerra; o
que se guarda, e se esconde é a primeira coisa, que se
assalta; a liberdade do pôrto é o que o conserva livre de
invasão.


O estimarem-se as coisas, que não têm valor, é (115) o
mesmo que fazê-las estimáveis: o que se busca com ânsia, não
é o que se dá, mas o que se nega; o que
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