National Geographic - Portugal - Edição 223 (2019-10)

(Antfer) #1
GIRAFAS 61

Tratadores removem uma
girafa morta numa armadilha
em Amboseli (Quénia). Um
animal pode fornecer 300
quilogramas de preciosa
carne. Por vezes, as girafas
são abatidas apenas para
obtenção das suas caudas,
símbolos de estatuto em
algumas culturas.
BRENT STIRTON

A translocação não escapa às críticas. “Se as
girafas estão efectivamente em perigo, por que
motivo os seus efectivos continuam a aumen-
tar? “Sempre que possível, é melhor deixar as
girafas determinarem naturalmente o habitat
mais adequado às suas necessidades”, diz Isa-
belle Ciofolo, especialista em etologia que se
juntou aos esforços de conservação locais em
Koure em meados da década de 1990. Salienta
aliás que as girafas do Níger têm capacidade
para percorrer trezentos quilómetros. “Se existir
uma ameaça num sítio, elas são perfeitamente
capazes de arranjar um novo habitat sozinhas.”

“LINDA MENINA. Que querida”, sussurra Pete
Morkel para si próprio enquanto se aproxima sorra-
teiramente da girafa inocente. Calcula que o animal
pese cerca de 700 quilogramas. Define a pressão da
sua carabina para 12 bares para conseguir disparar
a 30 metros de distância e abre o fecho de segurança.
São 13 horas e a temperatura já chegou a 38°C.
“Nunca estive numa situação destas, em que
posso simplesmente aproximar-me a pé de uma
girafa. Por norma, viajamos numa carrinha de
caixa aberta e disparamos à distância”, diz Pete.
Em contrapartida, estas criaturas são estranhas.
Vivem em terras comunitárias e encontram regu-
larmente pastores e agricultores. Durante a noite,
enfiam as cabeças nos celeiros e comem as folhas
de feijão-frade que os aldeãos guardam para ali-
mentar o seu gado, bem como as suas mangas e
abóboras. Felizmente para todos, o único alimen-
to que, misteriosamente, não apreciam é o milho-
-miúdo, o nutritivo cereal autóctone que é a base
do regime alimentar dos habitantes locais.
Pete apoia a arma no ombro e prime o gatilho,
lançando o dardo carregado de etorfina para o
quadril esquerdo do animal. O tiro é certeiro,
mas o fármaco demorará vários minutos até fa-
zer efeito. A sedação de girafas selvagens é uma
prática relativamente nova que tem sido apu-
rada ao longo dos últimos 30 anos e comporta
riscos consideráveis. O animal pode sofrer uma
paragem respiratória, se a dose do opióide for ex-
cessiva. Pode cair de cabeça e fracturar o crânio,
o seu longo dorso ou as patas compridas. Pode
regurgitar alimentos parcialmente digeridos e
inalá-los, contraindo uma pneumonia. E pode
sobreaquecer enquanto jaz sobre a areia escal-
dante. Durante uma translocação no Uganda em
2017, três animais morreram decomplicações
relacionadas com a capturae outromorreudu-
rante o transporte.

NA ÁFRICA ORIENTAL, AS
VEDAÇÕES REPRESENTAM
UMA AMEAÇA PIOR DO QUE A

CAÇA FURTIVA. AS GIRAFAS NÃO


CONSEGUEM SALTÁ-LAS, PELO
QUE OS SEUS TERRITÓRIOS
SE FRAGMENTAM. (Continua na pg. 68)
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