Público - 01.11.2019

(Ron) #1

22 | ípsilon | Sexta-feira 1 Novembro 2019


Em comemoração


dos 25 anos


da sua ligação


proÄssional ao


fado, Aldina


Duarte atira-se


a clássicos de Tony


de Matos, Amália,


Carlos do Carmo,


Maria da Fé


ou Beatriz


da Conceição.


Roubados é Aldina


a mostrar-nos


o fado como


razão de viver.


Gonçalo


Frota


O fascismo


levou-lhe


a infância, o


fado deu-lhe


a vida adulta


H


ouve duas revoluções na vida
de Aldina Duarte. A primeira
pôs fim ao longo período da
ditadura que sufocou Portu-
gal durante 48 anos. A infân-
cia, acusa Aldina, foi-lhe
roubada pelo fascismo (o pai morreu
na Guerra Colonial). Uma infância em
que se lembra de viver rodeada de
violência – física e não só – e de po-
breza; anos que, reconhece, a equi-
param com o estofo para resistir ao
sofrimento. Ainda hoje, agradece dia-
riamente por não ter amargado e
conservar um permanente espírito
esperançoso – mesmo diante das mais
dolorosas e cruéis experiências da
sua vida, acredita sempre que algo de
positivo germinará da superação de
cada uma dessas dores. A segunda
revolução chegou com a entrada do
fado na sua vida. E, em 2019, cum-
prem-se 25 anos sobre o momento

em que essa revolução se concreti-
zou, ao profissionalizar-se nas Noites
de Fado da Comuna, dois anos depois
de Jorge Silva Melo a ter levado a cru-
zar-se com a voz de Beatriz da Con-
ceição e as certezas que então carre-
gava consigo se viram viradas do
avesso. “25 de Abril, 25 de fado”, ri-se
Aldina Duarte.
Se a primeira data a leva todos os
anos a descer a Avenida da Liberdade,
a celebração do seu nascimento para
o fado é agora comemorada com a
edição do álbum Roubados. E é por
isso que a encontramos na capa do
disco com uma expressão jovem e
serena, numa fotografia que, sem o
saber, precede a revolução que Aldina
fez sua.
“Pouco depois viria a primeira vez
que cantei um fado, nem sabia ainda
bem o que era”, admite. Foi em plena
rodagem do filme Xavier (1992), de

Manuel Mozos, quando o realizador
lhe pediu a ela, a quem cabia um papel
de “miúda da rua”, que cantasse um
par de fados na mítica Rua do Capelão,
na Mouraria (onde morreu Maria Se-
vera e nasceu Fernando Maurício):
Novo fado da Severa (Rua do Capelão),
tema popularizado por Amália, e Nem
às paredes confesso. “Tinha aprendido
aquilo como quem aprende outra
coisa qualquer”, recorda. “Foi muito
estranho – as pessoas a aplaudirem e
eu a ter de cantar novamente.”
E logo deflagrava um turbilhão na
vida de Aldina Duarte. Até então, as
várias ocupações profissionais que
experimentara nunca a tinham real-
mente preenchido: “Era por curiosi-
dade que abraçava os meus trabalhos
e que fazia o esforço que fazia, mas
nada me realizava e, ao fim de algum
tempo, estava sempre insatisfeita e
queria mudar.” Foi então tomada por
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