Vingança a Sangue-Frio

(Carla ScalaEjcveS) #1

até ao ralo. Seguiu o riacho até ao pé direito, onde sangue lhe surgia por entre
os dedos. Levantou-se no meio do vidro partido; nem sequer reparara naquilo.
Não reparara em nada. Voltou a olhar para o espelho e riu-se.


Vigdis pousou o auscultador. Fora forçada a improvisar, apesar de odiar
fazê-lo. Sentia-se fisicamente doente quando as coisas não corriam de acordo
com os seus planos. Desde criança que percebera que nada acontecia por
acaso. O planeamento era tudo. Ainda se recordava de quando a família se
mudara de Slemdal para Skien, na altura em que estava na terceira classe.
Ficara de pé em frente da sua nova turma e apresentara-se, enquanto as outras
crianças permaneciam sentadas a olhar para ela, para a sua roupa e o estranho
saco de plástico que fizera com que algumas das raparigas apontassem e
soltassem risadinhas. Durante a última lição do dia escrevera uma lista em
que detalhava quais as raparigas da aula que iriam ser as suas melhores
amigas, aquelas que iria desprezar, que rapazes se iriam apaixonar por ela e
quais os professores que a iriam escolher como melhor aluna. Ao voltar a
casa, pendurara a lista por cima da cama e só a tirara no Natal, altura em que
já havia um risco ao lado de cada nome.


Mas agora era diferente. Agora estava à mercê de outros para que a vida
encaixasse no seu devido lugar.


Olhou para o relógio. Vinte para as dez. Tom Waaler dissera que estaria ali
dentro de doze minutos. Prometera desligar as sirenes muito antes de chegar a
Slemdal, para que ela não tivesse de se preocupar com os vizinhos. Vigdis
nem sequer lhe falara nisso.


Ficou sentada no vestíbulo à espera. Esperava que Hole tivesse adormecido
no banho. Voltou a olhar para o relógio. Ouviu a música. Afortunadamente, as
desgastantes músicas dos Police tinham terminado e agora Sting cantava
músicas do seu álbum a solo, com a sua voz maravilhosa e relaxante. Acerca
da chuva... como lágrimas de uma estrela. Era tão bela que quase sentia
vontade de chorar.


Depois ouviu Gregor a ladrar num tom rouco. Finalmente.
Abriu a porta e saiu para os degraus da entrada conforme combinado. Viu
uma figura a atravessar o jardim a correr em direcção ao terraço, e outra a dar
a volta até às traseiras da casa. Dois homens vestidos de uniformes negros e
armados com semiautomáticas pequenas pararam em frente dela.


– Ainda está no banho? – sussurrou um deles, atrás de uma balaclava preta.
– À esquerda no cimo das escadas?


–   Sim,    Tom –   sussurrou   ela em  resposta.   –   E   obrigada    por ter vindo   tão...
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