A Marca do Assassino

(Carla ScalaEjcveS) #1

JANEIRO


SHELTER ISLAND, NOVA YORK


Algumas noites eram melhores do que outras. Em certas noites, Elizabeth
assistia a tudo outra vez nos seus sonhos e acordava a gritar, esfregando as mãos
para tentar tirar as manchas de sangue. Em certas noites, Michael acordava, tendo
sonhado que Outubro lhe tinha dado três tiros no rosto, em vez de um no peito. A
casa de hóspedes foi restaurada e repintada, mas Elizabeth nunca mais lá voltou.
Por vezes, Michael sentava-se na ponta do cais e espreitava as águas em torvelinho.
Por vezes, passava uma hora antes que despertasse do seu transe. Por vezes,
Elizabeth observava-o do relvado e imaginava exatamente o que ele estava a pensar.
Sobre o que aconteceu a seguir, Michael só sabia o que lia nos jornais ou via
na televisão mas, como qualquer membro dos serviços secretos, geralmente
considerava as notícias dadas pelos órgãos de comunicação social como música de
fundo irritante. Todas as manhãs, o novo caseiro ia até a drogaria em Shelter Island
Heights buscar os jornais (The New York Times, The Wall Street Journal, Newsday)
e deixava-os sobre a mesa-de-cabeceira de Michael. No dia de Ano Novo, Michael
sentia-se forte o suficiente para fazer a viagem também. Sentou-se no banco do
passageiro do seu Jaguar e, pela janela, fitou em silêncio a água e as árvores nuas
de Inverno. O interesse esmoreceu à medida que Janeiro ia passando e, por altura
do Dia da Inauguração, já deixara de ler completamente os jornais.
Beckwith suportou bem os tempos difíceis. O mérito foi atribuído à esposa,
Anne. Esta tornara-se a conselheira mais importante do Presidente desde a morte
de Paul Vandenberg. Foi capa da News week na edição da semana do Natal e, no
interior, podia ler-se um artigo esplendoroso sobre a sua perspicácia política. Anne
teria de desempenhar um papel fundamental a partir das sombras para que o
segundo mandato de Beckwith fosse bem sucedido. Segundo os mexericos de
Washington, foi Anne quem levou o Presidente a insistir numa reforma radical do
financiamento das campanhas. Com o fervor dos recém-convertidos, Beckwith
pediu a proibição de contribuições irregulares aos partidos (o "dinheiro fácil"), e
pressionou as estações de televisão a dar aos candidatos tempo de antena gratuito.
Por volta do Dia da Inauguração, a sua taxa de aprovação atingira os sessenta por
cento.
Dois dos amigos e apoiantes mais chegados de Beckwith não se saíram tão
bem. Samuel Braxton viu-se obrigado a recusar a nomeação para secretário de

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