perder, pois Novembro era já a seguir e, se hoje a sua segurança estava por
pinças, depois da independência então nem um único soldado restaria para
garantir a sobrevivência deles.
Em Lisboa, generalizava-se a ideia de que o caos angolano, a guerra civil,
já não era um problema português e, no final, o processo de descolonização
desenrolou-se mesmo sem um verdadeiro controlo dos portugueses. Desde o
25 de Abril, o Partido Socialista, o Partido Comunista e os militares do MFA
tinham-se revelado os mais irredutíveis defensores da descolonização. A bem
ou a mal, a ideia era despachar o assunto. A certa altura, todos eles deixaram
de ter mão no processo, foram ultrapassados pelos acontecimentos com a
entrada em jogo das potências mundiais. Os Estados Unidos apoiaram a
FNLA, a União Soviética e Cuba ajudaram o MPLA. A África do Sul,
sentindo-se ameaçada com a perspectiva de uma vizinha Angola comunista,
ajudou a UNITA. Já não se tratava apenas de Portugal descolonizar Angola,
pois o vasto e rico território estava no centro da Guerra Fria e nenhum dos
lados queria perder. A situação explodiu. Para o Partido Socialista e o seu
secretário-geral, que apesar de ser um dos responsáveis principais pelas
negociações nunca visitou Luanda enquanto estas decorriam, a nova situação,
a intervenção internacional, era o perfeito alibi político, a explicação plausível
para tudo o que correu mal no fim. Em todo o caso, os socialistas haveriam de
insistir sempre que o processo não tinha conserto porque os militares, pura e
simplesmente, não obedeciam à ordem para reforçar o dispositivo em Angola,
e os próprios soldados que ainda restavam no território se recusavam a
permanecer mais tempo. Angola não teria nem eleições nem uma
transferência de poderes pacífica porque as Forças Armadas Portuguesas se
demitiram do dever de assegurar um período suficientemente dilatado que
permitisse essa transição para a democracia. Já o Partido Comunista, com a
colaboração dos seus aliados do MFA em Angola, conseguiu a enorme vitória
de encaminhar o novo país para a influência soviética, através do MPLA. Os
interesses nacionais foram sacrificados à solidariedade internacional. Os
comunistas apoiavam-se mutuamente, hoje eu ajudo-te, amanhã ajudas-me tu.
Havia contas a pagar e Moscovo não era meigo a cobrá-las. Algures, no meio
deste tropel de jogadas da real politik, perderam-se os direitos dos civis
portugueses que viviam em Angola e que não tiveram ninguém para os
defender.