O Último Ano em Luanda

(Carla ScalaEjcveS) #1

— Quem é que lhe deu o meu número? — quis saber Regina, estupefacta
com o telefonema dele. Ao que ele respondeu com a jovialidade do costume.


— Eu sou como os jornalistas — disse —, nunca revelo as minhas fontes.
— Como os jornalistas, é? Eu acho que vou matar um jornalista esta noite
— declarou, lançando um olhar furioso a Patrício, que entretanto regressara à
sala. Ele apontou com o polegar para trás das costas e mexeu os lábios, de
modo a marcar bem uma frase sussurrada: Vai para a bicha. Regina entendeu
e ameaçou-o com um punho fechado e com os lábios comprimidos numa fúria
contida, a prometer-lhe uma desanda para dali a pouco. — Então, diga lá, a
que devo a sua chamada? — perguntou, alegremente, regressando ao
telefonema. A sorte de Patrício, pensou Regina, é que o cavaleiro andante
tinha a virtude de a pôr bem-disposta.


Falaram durante alguns minutos. Ele perguntou-lhe se sempre queria a
boleia de regresso, ela disse que não, obrigada, não me vou embora enquanto
não encontrar o Nuno. Em todo o caso, ele fez questão de lhe dizer a hora da
partida e lhe dar as coordenadas certas para o descobrir no aeroporto até ao
último minuto. Prometeu deixar uma pessoa de plantão no balcão da TAP até
o avião levantar. Se ela aparecesse, seria embarcada imediatamente; caso
contrário, boa sorte. Regina agradeceu-lhe, emocionada pela sua vontade de
ajudá-la, desligou com uma lágrima no olho, respirou fundo, voltou-se para
Patrício.


— Então — atirou-lhe —, julgavas que te vias livre de mim com uma
conspiraçãozinha?


Ele abriu os braços, rendendo-se à evidência.
— Parece que não resultou.
Regina foi sentar-se a uma mesa redonda, por detrás dos sofás, no lado da
sala que dava para a porta da cozinha. Acendeu um cigarro, a reparar que
andava a fumar como nunca. Pudera! Com os nervos neste estado . Deu uma
passa longa, expulsou o fumo dos pulmões, tamborilou os dedos irrequietos
no tampo da mesa.


— Parece que não resultou — repetiu, pensativa, levantou a cabeça, olhou-
o de frente. — Da próxima vez que te lembrares de fazer alguma coisa nas
minhas costas, pensa duas vezes. Já me basta não poder confiar no sacana do
Antero.


Patrício    estava  encostado   às  costas  do  sofá,   com os  braços  cruzados    e   as
Free download pdf