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O jipe desengonçado aventurou-se por uma estrada que se ia desertificando
à medida que se afastava do centro da capital. O caminho para Quifangondo
seria uma curta viagem sem história, caso não implicasse atravessar
quilómetros de território hostil. Fazia-se pela saída norte da cidade, conhecida
pela Estrada do Cacuaco, que acompanhava a costa. Primeiro, eram os
subúrbios de Luanda com os seus musseques controlados pelo MPLA, depois
penetrava-se numa região cada vez menos populosa até se sentir a inquietante
sensação de se estar à mercê de qualquer grupo armado sem escrúpulos e, em
seguida, mais uma ou outra população miserável, sempre com o credo na
boca. O trânsito que se verificava era quase exclusivamente constituído por
camiões de transporte militar, tropas em direcção à frente de combate.
Tinham passado uma boa meia hora a colar tiras de fita gomada nas portas
do jipe, de modo a formarem a palavra imprensa em letras garrafais. Patrício
não parara de praguejar, contrariado por ter aceitado embarcar numa aventura,
nas suas palavras, tão estúpida quanto suicida. Regina achava que ele
exagerava, que se punham lá em três quartos de hora, na pior das hipóteses.
Ele tinha o seu cartão de jornalista e conseguira uma carta de recomendação
escrita e assinada pela mão amiga de um destacado oficial das FAPLA, cujo
nome era suficientemente conhecido para pôr em sentido qualquer idiota que
a lesse, ou pelo menos, esperava ele, suficientemente impressionante para não
os fuzilarem por simples capricho.
— Não vai haver novidade — disse Regina, dando-lhe uma palmadinha no
ombro quando entraram no jipe, para o animar.
— Nããão, claro que não — resmungou ele, furioso consigo mesmo por não
ser capaz de impedir uma viagem incrivelmente perigosa e inútil. O que o
espantava mais, era que a coragem bastava-lhe para arriscar uma visita à
frente mas não lhe chegava para contar a verdade a Regina. Por mais de uma
vez ensaiara dizer-lhe que desistisse porque Nuno não regressaria, estava
morto, ponto final, mas, então como hoje, as palavras, simplesmente, não lhe
saíram da boca. Como é que podia dizer a Regina algo tão brutal, destruir-lhe
a esperança, arrasá-la psicologicamente? Patrício estava a descobrir que era
mais fácil a bravura física do que a coragem moral.
O que convencera Patrício a ir à procura de Nuno a um lugar onde ele sabia
perfeitamente que não o iria encontrar foi o entusiasmo de Regina, a certeza