O Último Ano em Luanda

(Carla ScalaEjcveS) #1

fazenda. Percorreram no mínimo dois. Atravessaram uma pequena ponte de
madeira frágil, por cima de um riacho. Nessa altura, Patrício viu-se obrigado a
abrandar.


— Eu bem me parecia que era bom demais para ser verdade — resmungou.
— O que é aquilo? — perguntou Regina, alarmada, endireitando-se no
lugar e esticando-se para a frente para ver melhor. Patrício crispou os dedos
no volante sem tomar nota da pergunta dela.


Encontravam-se positivamente no meio do nada, à direita e à esquerda não
se via vivalma, apenas uma terra amarela, árida, pontuada acidentalmente por
oásis verdes. Fazia tanto calor que, vislumbrando a paisagem ao longe, se
tinha a ilusão de que se ia direito a uma lagoa, tal e qual como no deserto.
Mais à frente, a estrada atravessava precisamente uma dessas manchas de
arvoredos frondosos quando se depararam com a barreira. Patrício começou a
praguejar merda, merda, merda, o que deixou Regina apreensiva.


Reduziu a velocidade ao mínimo, deixou o jipe deslizar sem movimentos
precipitados e imobilizar-se a uns prudentes cinco metros dos bidões
colocados no meio da estrada.


— O que é isto? — insistiu Regina, num sussurro temeroso.
— Um posto de controlo — disse ele.
— Mas não há ninguém aqui. Porque é que não passas à volta?
— Não é boa ideia — comentou Patrício, pensativo, de olhos postos nas
árvores. — Eles estão por ali.


Aguardaram dois ou três minutos, uma eternidade. Ali parados, sem a
deslocação do ar quente do carro em movimento, o calor tornava-se
insuportável e em breve começaram a sentir a roupa empapada de suor. Ainda
assim esperaram, até que dois homens armados surgiram do interior da
floresta e foram-se aproximando sem pressa, num passo indolente. Foi a vez
de Regina praguejar entredentes.


— Merda, merda, merda...
— Calma — aconselhou Patrício. — Deixa-me ser eu a falar com eles.
Traziam as Kalash a tiracolo, encostadas ao peito como bebés, displicentes,
mas não tanto quanto pareciam, pois mantiveram o dedo no gatilho e não
desviaram os olhos desconfiados enquanto davam uma volta completa ao jipe.
Não fossem as armas e nada os distinguiria dos civis andrajosos que
aparentavam ser. Teriam vinte e poucos anos. Um deles usava uma camisa

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