— Está tudo bem — disse, para sossegar Regina. — Dá-me aí um maço de
tabaco.
Como nenhum deles sabia ler, Patrício disse-lhes o que estava escrito no
documento do quartel-general. O selo branco no passe era impressionante,
sem dúvida, mas eles mostraram-se inflexíveis. Tinham as suas ordens, aquilo
não era Luanda e quem mandava ali eram eles. Não podiam prosseguir
viagem, teriam de voltar para trás.
Patrício não se preocupou muito e continuou a falar. Com o andar da
conversa percebeu que os dois homens haviam sido deixados naquele lugar
desolado há duas semanas e ali continuavam, sem nada para comer e sem
nada para beber. Como sobreviviam, era um mistério. Aparentemente, o
comandante esquecera-se deles, mas sentiam-se tão orgulhosos do seu posto
de controlo que não desanimavam, nem mesmo com o facto de Patrício e
Regina serem os primeiros a passar por lá nos últimos quinze dias. O que lhes
interessava era serem a autoridade local, o resto eram detalhes.
Entretanto, Patrício abasteceu-os de cigarros, ofereceu-lhes as sandes que
traziam para depois, deu-lhes uma garrafa de água, explicou-lhes que estavam
todos do mesmo lado da trincheira e que também ele tinha a sua missão. Era
jornalista e precisava de contar ao mundo as vitórias das FAPLA e a
libertação do povo angolano. Provavelmente, disse, os dois camaradas até já o
tinham escutado na emissora onde ele falava. Fosse como fosse, as notícias
ajudavam o MPLA a ganhar a guerra e era por isso que ele tinha o passe do
quartel-general. Mais um quarto de hora de paleio, mais uma maço de tabaco
para cada um e pode seguir camarada. Removeram os bidões da estrada,
Patrício meteu-se no jipe e arrancou devagar, com saudações amistosas de
parte a parte.
— Desta já nos safámos — disse Regina, soltando um suspiro.
— Sim — concordou ele. — Vais ver que, a partir de agora, vai ser tudo
melhor — acrescentou, para a animar.
Mas não seria. Pelo contrário, na fazenda, esperava-os um pesadelo.