O Último Ano em Luanda

(Carla ScalaEjcveS) #1

Regina deitou a testa na palma da mão a abanar a cabeça exasperada. Não,
não, não, não, não!!!, gritou. A seu lado, Nuno mantinha-se impávido, de
olhos pousados no horizonte. Patrício estava lá fora de mãos nos bolsos e a
pontapear pedrinhas numa frustração. A frota portuguesa ali mesmo à frente,
ao largo, seis navios fundeados nas águas tranquilas da baía de Luanda. Bem,
pensou Regina, não é agora que vou desistir.


— Patrício — chamou-o. — Faz sinais de luzes com os faróis, que eu vou
procurar ali se encontro alguma coisa útil — apontou para um bote salva-
vidas tapado por uma lona, à direita do jipe.


Destapou o bote, espreitou para baixo dos bancos, descobriu uma caixa com
a cruz vermelha pintada na tampa. Abriu-a e retirou de lá uma pistola de
sinalização e o respectivo foguete. Carregou a pistola, apontou para o ar e
apertou o gatilho.


De cotovelos apoiados na amurada do navio de passageiros Niassa , o
capitão Antero avistou claramente o sinal luminoso lançado por Regina. De
resto, já há alguns minutos que vinha a seguir o SOS em morse piscado pelos
faróis do jipe de Patrício. Regina conseguira safar-se, pensou Antero,
balançando entre a admiração e o desânimo, filha da mãe, ainda não era desta
que a via falhar. Percorreu o convés em passo firme e desceu por uma
passadeira até à lancha que o aguardava encostada ao navio. Antero alertara
previamente o comandante do Niassa da eventual necessidade de voltarem a
terra para recolherem dois civis portugueses em apuros, e este deixara uma
lancha de prevenção. Antero saltou para bordo e disse vamos lá despachar isto
rapidamente. Os marinheiros soltaram amarras, a lancha recuou lentamente,
imobilizou-se, o motor fez-se ouvir e a proa empinou-se ligeiramente quando
começaram a dirigir-se para terra. Era uma questão de sete ou oito minutos
para chegarem ao cais, porventura demasiado tarde para Nuno e Regina. A
lancha vinha aí e ela rejubilou de felicidade, mas só até Patrício exclamar
merda, vêm aí soldados, e ela voltar-se para trás e ver os camuflados a
tomarem conta da base naval.

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