30 • Público • Quinta-feira, 19 de Setembro de 2019
MUNDO
Israelitas vislumbram uma era
pós-Benjamin Netanyahu
ABIR SULTAN/EPA
Netanyahu, Gantz, Lieberman e Odeh são as figuras-chave a seguir no pós-eleições em Israel
Os dois principais partidos em Israel
continuavam com apenas um depu-
tado de diferença com 90% dos votos
contados. Se era ainda arriscado pre-
ver um vencedor — e quem será o
chefe do governo —, era claro quem
não ganhou: Benjamin Netanyahu.
Mesmo que haja uma surpresa e
“Bibi” consiga fazer a sua magia e o
seu Likud (direita) permaneça o par-
tido mais votado, e mesmo que se
consiga manter primeiro-ministro, o
que está longe de ser certo, o primei-
ro-ministro usou todos os trunfos
possíveis e imaginários, torpedean-
do até a lei eleitoral, e não conseguiu
uma vitória convincente.
Segundo os resultados parciais, o
Likud tem 31 deputados e o partido
Azul e Branco (centro-esquerda), lide-
rado pelo antigo chefe do Exército
Benny Gantz, 32. Na repetição das
legislativas de Abril, os dois tiveram
um empate semelhante, mas Netanya-
hu não conseguiu uma maioria, e
forçou novas eleições.
O certo é que os eleitores não
deram um novo mandato a Netanya-
hu — a votação no Likud diminuiu, e
o bloco que liderava reduziu-se. Se
Netanyahu conseguir uma coligação,
será à custa de muitas concessões.
“Em suma, os resultados mostram
que há suÆcientes israelitas indiferen-
tes à perspectiva da vida política sem
Netanyahu”, escreveu David Horowitz
no jornal Times of Israel.
A Lista [Árabe] Unida foi o terceiro
partido mais votado. Uma das armas
de Netanyahu na campanha foi a agi-
tação do medo dos cidadãos árabes
de Israel: que estavam a votar em
massa, o que iria prejudicar a direita.
Esta agitação funcionou ao contrário
e o partido árabe teve 13 deputados
segundo os resultados parciais (fal-
tam os votos postais, de diplomatas,
soldados e doentes hospitalizados,
que por vezes alteram os resultados
em um ou dois deputados).
Segue-se o partido de Avigdor Lie-
berman, Yisrael Beitenu (Israel Nossa
Casa, direita radical nacionalista),
que, apesar de ter apenas nove depu-
tados, poderá ser essencial para des-
Outubro pelo procurador-geral numa
audiência que é obrigatória antes de
uma acusação.
Gantz declarou que “Netanyahu
falhou” e disse que se preparava para
falar com todos. “A época das divisões
terminou.” O que não disse foi que
falou com o líder da Lista Conjunta,
Ayman Odeh.
E Odeh foi o pretexto para que
Netanyahu levantasse o espectro do
“perigo dos árabes” e dissesse que a
sua prioridade era evitar “um gover-
no anti-sionista” perante o perigo de
incluir “traidores”.
Isto, porque Odeh admitiu indicar
ao Presidente uma recomendação de
candidato que inicie negociações
para uma coligação, podendo indicar
Gantz e dar a este último a prerroga-
tiva de formar governo. Seria a pri-
meira vez que um partido árabe faria
esta recomendação.
Os jornalistas na noite eleitoral na
sede do Likud davam conta da diÆcul-
dade de Netanyahu em mostrar-se
optimista. Os membros do partido
pareciam dar-lhe os pêsames. E, off
the record , havia quem dissesse que
talvez seja altura de ter outro líder.
Sublinhando a gravidade da sua
situação, Netanyahu anunciou que
não irá à Assembleia Geral das Nações
Unidas em Nova Iorque. O jornalista
da Economist Gregg Carlstrom comen-
tava: “Sabe-se que Netanyahu está
nervoso se está a falhar o que é, para
ele, o Super Bowl do calendário polí-
tico [o ponto alto do ano no palco
mundial]. ”
Resultados ainda parciais não afastam a possibilidade de Netanyahu continuar a ser primeiro-ministro
após a votação de terça-feira. Mas mostram um caminho difícil e deixaram-no enfraquecido
[email protected]
Eleições em Israel
Maria João Guimarães
bloquear o nó e assegurar um gover-
no. Lieberman pode juntar-se a
Netanyahu ou a Gantz, mas repetiu o
que disse na campanha: que vai pres-
sionar para haver um governo de
unidade nacional com o Likud, o Azul
e Branco, e o seu próprio partido.
Lieberman apresentou-se como o
representante do secularismo contra
um Estado com muitas restrições
religiosas e em que os religiosos têm
benesses, incluindo não terem de
fazer o serviço militar obrigatório —
algo essencial para um país como
Israel que tem acordos de paz apenas
com dois vizinhos. Após a votação
de Abril, Lieberman recusou-se a
integrar de novo uma coligação com
o Likud e os partidos ultra-ortodo-
xos, porque estes querem manter a
excepção.
A seguir à divulgação dos resulta-
dos preliminares, Lieberman especi-
Æcou as suas exigências para partici-
par numa coligação: Æm da excepção
do serviço para os ultra-ortodoxos,
estudo geral obrigatório para os ultra-
-ortodoxos (e não apenas estudo reli-
gioso), possibilidade de casamento
civil (actualmente apenas existe o
religioso; pessoas de duas religiões
diferentes têm de se casar no estran-
geiro) e transportes públicos e super-
mercados abertos no shabbat (quan-
do o país praticamente pára).
Dos dois outros partidos, ninguém
abriu ou fechou a porta a uma coope-
ração, embora na campanha Gantz
tenha dito que se recusa a fazer parte
de um governo com alguém acusado
de corrupção, como pode vir a ser
Netanyahu, que vai ser ouvido a 2 de
ABIR SULTAN/EPA
YONATAN SINDEL/EPA AMIR COHEN/REUTERS