Exame - Edição 1180 (2019-03-06)

(Antfer) #1

32 | http://www.exame.com


BRASIL | PREVIDÊNCIA


reforma da Previdência em sua conta do
Twitter, seu palco preferido. “O protago-
nismo do presidente é absolutamente es-
sencial, e ele tem de estar engajado em
profundidade. O distanciamento de Bol-
sonaro traria um sinal ruim para os depu-
tados”, afirma Clóvis Carvalho, ex-minis-
tro-chefe da Casa Civil durante o primeiro
mandato de Fernando Henrique Cardoso.
Assim como foi nas eleições, o papel das
redes sociais deve ser determinante na
trajetória do projeto da Previdência. Será
por meio delas que o governo poderá in-
formar e influenciar a população, que
apoia a reforma em termos gerais: segundo
pesquisa da corretora XP, 70% dos entre-
vistados são a favor do projeto, mas, quan-
do itens específicos são avaliados, como
idade mínima, a rejeição alcança a casa dos
60%. E será justamente pela repercussão
da opinião pública nas redes sociais que
muitos parlamentares poderão se pautar
a favor ou contra a reforma. Nas legislatu-
ras anteriores, a principal moeda de troca
entre Executivo e Legislativo eram verbas
generosas, as famosas emendas parlamen-
tares para obras e projetos nos redutos
eleitorais dos congressistas. As eleições de
2018 mostraram que esses recursos con-
vertem menos votos hoje do que no passa-
do. Políticos tradicionais que foram bene-
ficiados por esse dinheiro não se reelege-


ram ou ganharam uma nova chance por
um fio. “Como a articulação política é
precária, o governo vai jogar para a opinião
pública o papel de pressionar os parlamen-
tares. O apoio popular é que vai fazer a
diferença”, diz Garman, da Eurasia. Ainda
assim, velhos hábitos não se abandonam
facilmente: diversos deputados e senado-
res começam a pressionar o governo por
cargos de segundo escalão e também pela
liberação de verbas. O jornal O Globo esti-
mou que os pedidos chegam a 10 milhões
de reais por deputado do chamado centrão.
Outro ponto vital é a estratégia de negocia-


ção. E, nesse item, as barbeiragens políti-
cas de Bolsonaro e seus aliados podem
afetar negativamente a reforma. Deputa-
dos ouvidos por EXAME, em condição de
anonimato, dizem que não há organização
política do governo, dando margem a uma
desidratação ainda maior da proposta. Pro-
va disso foi a derrota do governo na vota-
ção do decreto que alteraria as regras da
Lei de Acesso à Informação. Na votação,
foram 367 deputados contra o projeto e 57
a favor. Um dos motivos apontados para o
fiasco é a escolha do deputado Major Vitor
Hugo (PSL-DF), um congressista de pri-
meiro mandato, para a organização políti-
ca. O governo tenta se mexer. “Recebo com
humildade as críticas e tenho conversado
com os líderes de todos os partidos para
montar uma base sólida”, diz Hugo.
A relação com o Congresso foi determi-
nante para os resultados alcançados pelas
três últimas reformas da Previdência. O
ex-presidente Fernando Henrique Cardo-
so perdeu a chance de estabelecer a idade
mínima por um voto em 1998, mas conse-
guiu colocar em prática o fator previden-
ciário, um cálculo que leva em conta o
tempo de contribuição, a idade do segura-
do e a expectativa de vida. A derrota de
FHC em fixar uma idade mínima para
aposentadoria contribuiu para uma perda
gigantesca para o país, segundo cálculos

do Itaú. “A situação fiscal na época do FHC
era outra, hoje temos um problema fiscal
de curto prazo”, diz Pedro Schneider, eco-
nomista do Itaú. Na época, o gasto previ-
denciário tinha um impacto de 6% do PIB.
Em 2017, a conta ficou em 10% (e, sem uma
reforma, o efeito deve ir para 12% em 2027).
Luiz Inácio Lula da Silva, por sua vez, con-
seguiu em seu primeiro ano de mandato
diminuir as disparidades entre os funcio-
nários públicos e os aposentados pela ini-
ciativa privada — porém, só para aqueles
que ingressaram no setor público de 2003
em diante. Dilma Rousseff, por meio de

LULA APROVOU SUA REFORMA COM


APOIO DE 72% DA OPOSIÇÃO. FHC


FRACASSOU AO TER APENAS 45%


Câmara dos Deputados: o texto
da reforma deve sofrer diversas
alterações antes da votação

Protesto na França: o país fez
duas reformas da Previdência
desde 2010 e vai para a terceira

FABIO RODRIGUES POZZEBOM/AGÊNCIA BRASIL

GONZALO FUENTES/REUTERS
Free download pdf